Decisão Terminativa de 2º Grau

Correção Monetária 0803350-43.2019.8.18.0026


Decisão Terminativa

poder judiciário 
tribunal de justiça do estado do piauí
GABINETE DO Desembargador ANTONIO LOPES DE OLIVEIRA


PROCESSO Nº: 0803350-43.2019.8.18.0026
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
ASSUNTO(S): [Correção Monetária]
APELANTE: MARIA DE LOURDES GOMES BARBOSA
APELADO: BANCO DO BRASIL SA
REPRESENTANTE: BANCO DO BRASIL SA


JuLIA Explica

EMENTA 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE PASEP C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO DO BRASIL. REJEIÇÃO. TEMA 1150/STJ. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. REJEIÇÃO. SÚMULA 42/STJ. PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO. REJEIÇÃO. TEMA 1150/STJ. MÉRITO. DISCUSSÃO SOBRE O ÔNUS DA PROVA DE LANÇAMENTOS A DÉBITO EM CONTAS INDIVIDUALIZADAS DO PASEP. AFETAÇÃO AO RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (PROAFR NO RESP Nº 2.162.222/PE). DETERMINAÇÃO DE SUSPENSÃO NACIONAL DO PROCESSO. APLICAÇÃO DO ART. 1.037, II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DECISÃO MONOCRÁTICA. 

  

RELATÓRIO 

Trata-se de Apelação Cível interposta por MARIA DE LOURDES GOMES BARBOSA (posteriormente substituída por seus herdeiros habilitados, ALBERTO CARLOS BARBOSA MACEDO e outros, conforme IDs 25249950 e 25251628), contra a sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Campo Maior/PI (ID 2198164), que julgou IMPROCEDENTES os pedidos formulados na Ação Revisional de PASEP c/c Indenização por Danos Morais ajuizada em face do BANCO DO BRASIL S.A. 

A Apelante narrou na exordial (ID 2198128) que, ao buscar o levantamento dos valores de sua conta PASEP após a aposentadoria, deparou-se com uma quantia irrisória de R$ 1.324,93, que considerou incompatível com o tempo de contribuição e a devida atualização monetária. Alegou que a microfilmagem de sua conta (ID 2198136) revelou um saldo de Cz$ 174.537,00 em 08/08/1988, que teria sido drasticamente reduzido para Cz$ 990,29 em 17/08/1989, configurando um "desfalque" ou "saque indevido". Sustentou que o Banco do Brasil S.A., na qualidade de administrador do PASEP, seria responsável pela má gestão e pela ausência de correção adequada dos valores, o que lhe causou danos materiais (estimados em R$ 283.138,78) e morais (R$ 5.000,00). Requereu a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e a inversão do ônus da prova. 

O Banco do Brasil S.A. apresentou contestação (ID 2198142), arguindo, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva, sob o fundamento de que atua como mero operador do PASEP, cuja gestão e definição de índices de correção cabem ao Conselho Diretor do Fundo PIS-PASEP, vinculado à União Federal. Alegou, ainda, a incompetência da Justiça Estadual, defendendo a competência da Justiça Federal para o processamento do feito. Em prejudicial de mérito, suscitou a prescrição quinquenal da pretensão autoral, com base no Decreto nº 20.910/32, contando-se o prazo a partir de 1988. No mérito, defendeu a regularidade das movimentações na conta da Apelante, afirmando que os débitos correspondem a pagamentos de rendimentos em folha ou conta corrente da própria titular, ou a conversões de moeda decorrentes de planos econômicos, e que os valores foram atualizados conforme a legislação vigente. 

A Apelante apresentou réplica (ID 2198155), refutando as teses defensivas e reiterando seus pedidos. 

A sentença de primeiro grau (ID 2198164), após sanear o processo (ID 2198156), rejeitou as preliminares de incompetência da Justiça Estadual e de prescrição. Contudo, acolheu parcialmente a preliminar de ilegitimidade passiva do Banco do Brasil S.A., reconhecendo sua legitimidade apenas para as questões relativas a "saques indevidos", mas não para a "correção dos valores depositados", atribuindo esta última responsabilidade à União. No mérito, o Juízo a quo julgou os pedidos IMPROCEDENTES, sob o entendimento de que a Apelante não comprovou os alegados saques indevidos, e que a responsabilidade pela correção monetária não seria do Banco do Brasil. 

Inconformada, a Apelante interpôs o presente recurso de Apelação (ID 2198266), pugnando pela reforma integral da sentença. Em suas razões, a Apelante reitera a legitimidade plena do Banco do Brasil para todas as pretensões, argumentando que a instituição tem gerência sobre as contas e dever de guarda dos valores. Insiste na ocorrência dos "desfalques" e "saques indevidos" comprovados pela microfilmagem, na má gestão da atualização monetária e na configuração dos danos morais. Impugna a ausência de manifestação específica do Banco sobre seus cálculos. 

O Banco do Brasil S.A. apresentou contrarrazões (ID 2198271), defendendo a manutenção da sentença e reiterando suas preliminares e argumentos de mérito. 

Em 22/01/2024, foi certificado o óbito da Apelante (ID 14937068), o que levou à suspensão do processo para habilitação dos herdeiros (ID 16210933). Os herdeiros foram devidamente habilitados em 22/05/2025 (IDs 25249950 e 25251628), e o processo foi retomado. 

Em 24/01/2025, o Banco do Brasil S.A. peticionou (ID 22514172) informando a afetação de controvérsia pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no ProAfR no REsp nº 2.162.222/PE, que trata do ônus da prova de lançamentos a débito em contas PASEP, e requerendo a suspensão nacional do presente feito. 

É o relatório. 

  

FUNDAMENTAÇÃO 

A presente Apelação Cível comporta decisão monocrática, nos termos do Art. 932, inciso III e IV, do Código de Processo Civil (CPC), uma vez que a matéria em discussão, especialmente no que tange às preliminares e à prejudicial de mérito, encontra-se pacificada pela jurisprudência vinculante do Superior Tribunal de Justiça, e o mérito da causa foi objeto de recente determinação de suspensão nacional por aquele Tribunal Superior. 

 

Das Preliminares e Prejudicial de Mérito 

Inicialmente, cumpre reexaminar as preliminares e a prejudicial de mérito arguidas pelo Banco do Brasil S.A. e analisadas pela sentença de primeiro grau, à luz da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça. 

 

Da Ilegitimidade Passiva do Banco do Brasil S.A. 

O Banco do Brasil S.A. alegou sua ilegitimidade passiva, sustentando ser mero operador do PASEP e que a responsabilidade pela gestão e correção dos valores seria da União. A sentença de primeiro grau acolheu parcialmente essa tese, afastando a legitimidade do Banco para a correção monetária, mas mantendo-a para os saques indevidos. 

Contudo, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 1150, sob o rito dos recursos repetitivos, pacificou a questão da legitimidade passiva do Banco do Brasil S.A. em ações que discutem o PASEP. A tese firmada é clara: 

i) o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto a conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; (REsp ns. 1.895.936, 1.895.941 e 1.951.931, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 13/9/2023, DJe de 16/12/2024). 

Desse modo, a legitimidade do Banco do Brasil S.A. abrange tanto as alegações de saques indevidos e desfalques quanto a eventual falha na aplicação dos rendimentos e correção monetária. A sentença de primeiro grau, ao limitar a legitimidade do Banco, contrariou o entendimento vinculante do STJ. 

 

Da Incompetência da Justiça Estadual 

O Banco do Brasil S.A. arguiu a incompetência da Justiça Estadual, defendendo a competência da Justiça Federal. A sentença de primeiro grau rejeitou essa preliminar, afirmando a competência da Justiça Estadual. 

A jurisprudência do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF) é uníssona ao reconhecer a competência da Justiça Estadual para julgar causas em que sociedades de economia mista são partes. 

  • Súmula 42 do STJ: "Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar as causas cíveis em que é parte sociedade de economia mista e os crimes praticados em seu detrimento." 

  • Súmula 508 do STF: "Compete à Justiça Estadual, em ambas as instâncias, processar e julgar as causas em que for parte o Banco do Brasil S.A." 

Portanto, a decisão de primeiro grau que rejeitou a preliminar de incompetência da Justiça Estadual está em perfeita consonância com a jurisprudência consolidada e vinculante dos Tribunais Superiores. 

 

Da Prescrição 

O Banco do Brasil S.A. suscitou a prescrição quinquenal da pretensão autoral. A sentença de primeiro grau rejeitou essa prejudicial, aplicando o princípio da actio nata. 

O Tema 1150 do STJ também abordou a questão da prescrição, estabelecendo que: 

  • II) a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo artigo 205 do Código Civil; e 

  • III) o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep. 

A Apelante alegou ter tido ciência dos supostos desfalques e da irrisoriedade do saldo apenas em 2019, ao obter a microfilmagem detalhada de sua conta. Considerando que a ação foi ajuizada no mesmo ano (2019), e aplicando-se o prazo decenal (Art. 205 do Código Civil) a partir da ciência inequívoca do dano (princípio da actio nata), a pretensão da Apelante não está prescrita. A decisão de primeiro grau que rejeitou a prescrição está em conformidade com o entendimento vinculante do STJ. 

 

Da Necessidade de Suspensão do Processo 

Após a análise das preliminares e da prejudicial de mérito, a controvérsia remanescente para o julgamento do mérito da apelação cinge-se à efetiva ocorrência dos saques indevidos e da má aplicação dos rendimentos, e, crucialmente, a quem compete o ônus da prova de tais fatos. 

Nesse ponto, o Superior Tribunal de Justiça, em decisão proferida em 11 de dezembro de 2024, com publicação no DJe de 16 de dezembro de 2024, afetou a questão do ônus da prova em ações que discutem lançamentos a débito em contas PASEP ao rito dos recursos repetitivos. Trata-se do ProAfR no REsp nº 2.162.222 - PE (Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura), que delimitou a seguinte controvérsia: 

  • "Saber a qual das partes compete o ônus de provar que os lançamentos a débito nas contas individualizadas do PASEP correspondem a pagamentos ao correntista." 

Mais importante ainda, a decisão de afetação do STJ determinou expressamente a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a mesma matéria e tramitem no território nacional, nos termos do Art. 1.037, inciso II, do Código de Processo Civil. 

A suspensão é medida imperativa para garantir a uniformidade da jurisprudência e evitar a prolação de decisões conflitantes sobre uma questão de direito que está sendo submetida à análise vinculante do Tribunal Superior. A definição do ônus da prova é um ponto central para o deslinde do mérito da presente Apelação, pois impactará diretamente a valoração das provas já produzidas e a necessidade de produção de novas provas. 

Considerando que a presente demanda envolve diretamente a controvérsia afetada pelo STJ, a suspensão do processo é medida que se impõe, aguardando-se a tese que será firmada pela Corte Superior. 

Por fim, registro que a habilitação dos herdeiros da Apelante foi devidamente processada, conforme IDs 25249950 e 25251628, permitindo o regular prosseguimento do feito após a suspensão. 

 

DISPOSITIVO 

Diante do exposto, e com fundamento no Art. 932, incisos III e IV, do Código de Processo Civil, bem como nas Súmulas e Temas Repetitivos do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, DECIDO MONOCRATICAMENTE: 

1. CONHECER do recurso de Apelação Cível. 

 

2. REFORMAR EM PARTE a sentença de primeiro grau para RECONHECER A LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO BANCO DO BRASIL S.A. para todas as pretensões discutidas na presente demanda, em conformidade com o Tema 1150 do STJ. 

 

3. MANTER A REJEIÇÃO das preliminares de incompetência da Justiça Estadual e da prejudicial de mérito da prescrição, nos termos da fundamentação. 

 

4. DETERMINAR A SUSPENSÃO DO PRESENTE PROCESSO, com fundamento no Art. 1.037, inciso II, do Código de Processo Civil, até o julgamento definitivo da controvérsia pelo Superior Tribunal de Justiça no ProAfR no REsp nº 2.162.222 - PE. 

Após a comunicação da tese firmada pelo STJ, o processo deverá ser retomado para o regular julgamento do mérito da Apelação. 

Comunique-se o teor desta decisão ao Juízo de origem. Intimem-se as partes. Cumpra-se. 

  


TERESINA-PI, 27 de agosto de 2025.

(TJPI - APELAÇÃO CÍVEL 0803350-43.2019.8.18.0026 - Relator: ANTONIO LOPES DE OLIVEIRA - 1ª Câmara Especializada Cível - Data 27/08/2025 )

Detalhes

Processo

0803350-43.2019.8.18.0026

Órgão Julgador

Desembargador ANTONIO LOPES DE OLIVEIRA

Órgão Julgador Colegiado

1ª Câmara Especializada Cível

Relator(a)

ANTONIO LOPES DE OLIVEIRA

Classe Judicial

APELAÇÃO CÍVEL

Competência

Câmaras Cíveis

Assunto Principal

Correção Monetária

Autor

MARIA DE LOURDES GOMES BARBOSA

Réu

BANCO DO BRASIL SA

Publicação

27/08/2025