Decisão Terminativa de 2º Grau

Tarifas 0832113-95.2022.8.18.0140


Decisão Terminativa

poder judiciário 
tribunal de justiça do estado do piauí
GABINETE DO Desembargador ANTONIO LOPES DE OLIVEIRA

PROCESSO Nº: 0832113-95.2022.8.18.0140
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
ASSUNTO(S): [Tarifas]
APELANTE: MARIA DA CRUZ BORGES LEAL FERREIRA
APELADO: BANCO BRADESCO SA, BANCO BRADESCO S.A.


JuLIA Explica

DECISÃO MONOCRÁTICA

 

 

Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO COMPROVADO. AUSÊNCIA DE CONTRATO E TRANSFERÊNCIA DE VALORES. NULIDADE DA AVENÇA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PROVIDO.

 

Vistos etc.

 

Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por MARIA DA CRUZ BORGES LEAL FERREIRA contra sentença exarada na AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, (Processo nº 0832113-95.2022.8.18.0140, Vara CÍVEL da Comarca de TERESINA/PI), ajuizada contra o BANCO BRADESCO S.A, ora apelado.

 

Ingressou a parte autora com a ação, alegando, em síntese, ser pessoa idosa, analfabeta e que vem sofrendo descontos em seu benefício previdenciário, referente a empréstimo, o qual afirma desconhecer.

Juntou documentos.

Requereu a nulidade do contrato, o pagamento de indenização por danos morais e o pagamento em dobro das parcelas que já foram descontadas de seu benefício, a título de repetição do indébito.

O banco réu apresentou contestação, pugnando pela improcedência dos pedidos iniciais. Juntou documentos, no entanto, não juntou o contrato válido aos autos, e nem apresentou o comprovante de transferência do valor contratado.

Em Réplica a contestação, a parte autora reiterou os pedidos formulados na inicial.

Por sentença (ID 20696692 – ID de origem 60802185), o d. Magistrado a quo, assim julgou: DIANTE DO EXPOSTO, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por MARIA DA CRUZ BORGES LEAL FERREIRA em face de BANCO BRADESCO S/A.

Diante da sucumbência, CONDENO o autor ao pagamento das custas processuais, bem como dos honorários advocatícios ao procurador da parte adversa, os quais fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da ação, levando em consideração a natureza da causa, bem como o tempo e o trabalho despendidos, em conformidade com o art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Suspendo, todavia, a exigibilidade das custas e honorários em face do deferimento da gratuidade da justiça, na forma do art. 98, § 3°, do CPC.

Inconformada, a parte autora apelou (ID 20696693 – ID de origem 61100327), suscitou em síntese, a ausência de juntada pelo banco de contrato válido e documento que comprove a autorização dos descontos da conta bancária, referente à (Tarifa Bancária Cesta B. Expresso), requerendo o acolhimento do recurso para a reforma da sentença.

Devidamente intimado, o banco apresentou suas contrarrazões (ID 20696696 – ID de origem 63844815), requerendo o improvimento do recurso e a manutenção da sentença.

 

É, em resumo, o relatório necessário.

 

O Recurso de Apelação merece ser conhecido, eis que estão comprovados os pressupostos da sua admissibilidade.

Delineada sumariamente a pretensão recursal, passo, de logo, ao julgamento monocrático do mesmo, eis que é dispensada a participação de Órgão Julgador Colegiado, nos moldes do art. 932, V, alínea “a”, do CPC, que autoriza o relator a dar provimento a recurso se a decisão recorrida for contrária a Súmula do próprio Tribunal.

O d. Magistrado a quo julgou a demanda improcedente.

Compulsando os autos, verifica-se que não consta nenhuma prova que ateste transferência dos valores contratados, haja vista a inexistência de documento hábel para comprovar a existência e validade da relação contratual, muito menos houve a juntada do contrato discutido nos autos, referente à (Tarifa Bancária Cesta B. Expresso) descontada da conta da parte autora.

Ademais, registre-se que a prova de transferência do valor contratado, é documento hábil para comprovar a existência e validade da relação contratual, não tendo a parte Ré/Apelante juntado aos autos o comprovante válido de transferência do valor contratado, razão esta que me leva ao entendimento de que deve ser aplicada a Súmula de nº 18, deste Eg. Tribunal:

SÚMULA Nº 18 – A ausência de transferência do valor do contrato para conta bancária de titularidade do mutuário enseja a declaração de nulidade da avença e seus consectários legais e pode ser comprovada pela juntada aos autos de documentos idôneos, voluntariamente pelas partes ou por determinação do magistrado nos termos do artigo 6º do Código de Processo Civil.

No caso em tela, o banco, quando da apresentação de sua contestação, como dito, não fez juntar comprovante válido de transferência do valor supostamente contratado, a fim de comprovar a realização do pacto descrito na inicial, muito menos juntou o contrato válido discutido nos autos, caracterizando, destarte, que as cobranças realizadas pelo banco basearam-se em contrato de empréstimo nulo.

Quanto ao pedido de indenização em razão do dano moral que afirma a parte apelante haver sofrido, tenho que lhe assiste razão.

Importa trazer à colação o disposto na primeira parte do parágrafo único do art. 927, do Código Civil:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

 

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Como dito, as instituições financeiras respondem objetivamente pela má prestação do serviço ou fornecimento do produto, sendo inequívoca a aplicação do art. 14 do CDC nas relações bancárias firmadas com a pessoa física ou jurídica na condição de consumidora final.

Deste modo, pode-se notar que a responsabilidade civil decorre do descumprimento obrigacional pela infringência a uma regra contratual, ou, por ausência de observância de um preceito normativo que regula a vida.

Da análise dos autos, verifica-se a inexistência de comprovação de autorização para efetuar descontos na conta da parte autora, vulnerável e hipossuficiente na relação jurídica.

Destarte, mais do que mero aborrecimento, patente o constrangimento e angústia suportados pela parte recorrente, na medida em que fora obrigada a ver reduzido seu provento por má conduta do banco.

Em relação ao quantum a ser arbitrado a título de ressarcimento por danos morais tenho que, ressalvada a notória dificuldade da fixação de valores a serem pagos a título de indenização por danos morais, e à vista da inexistência legal de critérios objetivos para seu arbitramento, o julgador deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Outrossim, deve-se atentar para a natureza jurídica da indenização, que não só deve constituir uma pena ao causador do dano e, concomitantemente, compensação ao lesado, como também o de cumprir o seu cunho pedagógico sem caracterizar enriquecimento ilícito.

Correto, por outro lado, que a indenização por danos morais não pode resultar em obtenção de vantagem indevida. Por outro prisma, também não pode ser irrisória, pois almeja coibir a repetição de comportamento descompromissado.

Dessa forma, levando em consideração o potencial econômico do recorrido, as circunstâncias e a extensão do evento danoso, ratifico o meu posicionamento, já adotado em casos semelhantes, entendendo por razoável e proporcional a condenação dos danos morais na quanta de cinco mil reais (R$ 5.000,00), a ser paga pelo banco à parte autora.

Portanto, fixo a condenação em danos morais em favor da parte Autora, ora Apelante, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Nessa esteira, cabível a repetição do indébito em dobro, ante a violação, via descontos nos benefícios previdenciários da apelante sem cumprir com a devida contraprestação, donde também se depreende a má-fé da instituição financeira, para efeitos da repetição dobrada prevista no art. 42, parágrafo único, CDC.

Diante do exposto, e sem a necessidade de maiores considerações, DOU PROVIMENTO ao RECURSO DE APELAÇÃO interposto por MARIA DA CRUZ BORGES LEAL FERREIRA, para declarar a nulidade do contrato em questão, com a determinação do banco a cancelar as cobranças das tarifas denominadas (CESTA BRADESCO EXPRESSO), devolução em dobro dos valores indevidamente descontados e arbitrar a indenização em danos morais no valor de cinco mil reais (R$ 5.000,00).

INVERSÃO dos ônus sucumbenciais, devendo os honorários advocatícios serem fixados em quinze por cento (15%) do valor da condenação

Intimem-se as partes para tomar ciência do inteiro teor desta decisão.

Transcorrendo in albis o prazo recursal, certifique-se.

Cumpra-se.

 

 

 


Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CDC, arts. 6º, VI, 14 e 42, parágrafo único; CC, art. 927, parágrafo único; CPC, art. 6º.

 

Jurisprudência relevante citada: TJPI, Súmula nº 18.

 

TERESINA-PI, 27 de agosto de 2025.

(TJPI - APELAÇÃO CÍVEL 0832113-95.2022.8.18.0140 - Relator: ANTONIO LOPES DE OLIVEIRA - 1ª Câmara Especializada Cível - Data 27/08/2025 )

Detalhes

Processo

0832113-95.2022.8.18.0140

Órgão Julgador

Desembargador ANTONIO LOPES DE OLIVEIRA

Órgão Julgador Colegiado

1ª Câmara Especializada Cível

Relator(a)

ANTONIO LOPES DE OLIVEIRA

Classe Judicial

APELAÇÃO CÍVEL

Competência

Câmaras Cíveis

Assunto Principal

Tarifas

Autor

MARIA DA CRUZ BORGES LEAL FERREIRA

Réu

BANCO BRADESCO SA

Publicação

27/08/2025