poder judiciário
tribunal de justiça do estado do piauí
GABINETE DO Desembargador JOSÉ WILSON FERREIRA DE ARAÚJO JÚNIOR
PROCESSO Nº: 0802816-34.2024.8.18.0088
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
ASSUNTO(S): [Indenização por Dano Moral, Empréstimo consignado]
APELANTE: JOSE MIGUEL MENDES DA ROCHA FILHO, MARIA DA CONCEICAO PAULINO
APELADO: BANCO OLE BONSUCESSO CONSIGNADO S.A.
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – CONTRATAÇÃO COMPROVADA – INSTRUMENTO CONTRATUAL ASSINADO E DEPÓSITO EFETUADO NA CONTA DO CONSUMIDOR – AUSÊNCIA DE PROVA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO – REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO MORAL INDEVIDAS – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA – RECURSO DESPROVIDO.
DECISÃO TERMINATIVA
I – RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Cível interposta por JOSE MIGUEL MENDES DA ROCHA FILHO e MARIA DA CONCEIÇÃO PAULINO contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Capitão de Campos/PI, nos autos de ação declaratória de inexistência de relação contratual c/c repetição de indébito e indenização por danos morais ajuizada em face de BANCO OLE BONSUCESSO CONSIGNADO S.A. (atual denominação “BANCO OLE CONSIGNADO S.A.”).
Sobreveio sentença em 25/06/2025, que julgou totalmente improcedentes os pedidos iniciais, com fundamento no art. 487, I, do CPC, sob o entendimento de que restaram comprovadas a existência do contrato e a disponibilização dos valores ao consumidor, afastando, por conseguinte, repetição de indébito e indenização por danos morais. (ID. 27088040).
Irresignados, os autores interpuseram recurso de Apelação (petição de interposição e razões), autuado em 16/07/2025 (ID. 27088042), no qual reiteram a tese de nulidade/ inexistência da contratação e alegam, em síntese, que a sentença divergiu de precedentes dos Tribunais Superiores e deste E. Tribunal, sustentando, ainda, a ausência de comprovação de depósito/ TED válido e a irregularidade formal de contrato supostamente firmado com pessoa analfabeta. Requerem a concessão da gratuidade da justiça e o provimento do apelo, com a condenação da parte apelada, inclusive em danos morais. (ID. 27088042).
Regularmente intimada, a parte apelada apresentou contrarrazões em 04/08/2025 (ID. 27088044), pugnando pela manutenção integral da sentença de improcedência, ao argumento de que a contratação é válida, inexistindo dano moral e qualquer ilicitude. Registra-se que as contrarrazões foram subscritas por advogado que se identifica como representante do BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., embora o polo passivo, conforme cadastro processual e sentença, seja do BANCO OLE BONSUCESSO CONSIGNADO S.A.; de todo modo, o teor das contrarrazões defende a validade da avença e requer o desprovimento do apelo. (ID. 27088044).
O processo foi regularmente instruído e não houve manifestação do Ministério Público, ante a ausência de interesse público relevante.
É o que importa relatar.
II – DO CONHECIMENTO DO RECURSO
Ao analisar os pressupostos objetivos, verifica-se que o recurso interposto é cabível, adequado e tempestivo. Além disso, não se verifica a existência de fato impeditivo de recurso e não ocorreu nenhuma das hipóteses de extinção anômala da via recursal (deserção, desistência e renúncia). Ausente o pagamento de preparo, em virtude de a parte Autora ser beneficiária da justiça gratuita.
Desse modo, conheço do recurso interposto.
III – MÉRITO
Preambularmente, consoante dispõe o art. 932, IV, “a”, do CPC, compete ao relator negar provimento ao recurso que contrariar súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal.
Tal previsão encontra-se, ainda, constante no art. 91, VI-B, do Regimento Interno deste E. Tribunal de Justiça, senão vejamos:
Art. 91. Compete ao Relator, nos feitos que lhe forem distribuídos, além de outros deveres legais e deste Regimento:
(…)
VI-B - negar provimento a recurso que for contrário a súmula deste Tribunal ou entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; (Incluído pelo art. 1º da Resolução nº 21, de 15/09/2016)
Utilizo-me, pois, de tais disposições normativas, uma vez que a matéria aqui trazida já foi amplamente deliberada nesta Corte de Justiça, possuindo até mesmo disposição de súmula.
Pois bem.
Adianto que não merece reforma a sentença recorrida.
Cinge-se a controvérsia acerca da pretensão da parte Recorrente em ver reconhecida a nulidade da contratação realizada entre as partes.
Preambularmente, não há dúvida de que a referida lide, por envolver a discussão acerca de falha na prestação de serviços, é regida pela ótica do Código de Defesa do Consumidor, o que inclusive, restou sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme a redação:
STJ/SÚMULA Nº 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.
Nas referidas ações, em regra, é deferida em favor da parte autora a inversão do ônus da prova, em razão da hipossuficiência técnica financeira, a fim de que a Instituição bancária Requerida comprove a existência do contrato, bem como o depósito da quantia contratada.
Esta é uma questão exaustivamente debatida nesta E. Câmara Especializada Cível, possuindo até mesmo disposição expressa na Súmula nº 26 deste TJPI, in litteris:
TJPI/SÚMULA Nº 26 – Nas causas que envolvem contratos bancários, aplica-se a inversão do ônus da prova em favor do consumidor (CDC, art, 6º, VIII) desde que comprovada sua hipossuficiência em relação à instituição financeira, entretanto, não dispensa que o consumidor prove a existência de indícios mínimos do fato constitutivo de seu direito, de forma voluntária ou por determinação do juízo.
Nesse contexto, é imprescindível que se reconheça a vulnerabilidade do consumidor. Contudo, a aplicação da norma consumerista não significa que a demanda promoverá um favorecimento desmedido de um sujeito em prol de outro, pois o objetivo da norma é justamente o alcance da paridade processual.
Cinge-se a controvérsia acerca da validade do contrato de empréstimo consignado firmado entre os apelantes e a instituição financeira apelada, bem como da possibilidade de declaração de inexistência da relação jurídica, repetição em dobro dos valores descontados e indenização por danos morais.
Os apelantes sustentam, em síntese, que não contrataram o empréstimo objeto da demanda, alegando ainda que um dos autores é analfabeto e que o contrato não atenderia às formalidades legais.
Todavia, compulsando os autos, observa-se que a instituição financeira apresentou elementos suficientes à comprovação da avença. Consta o instrumento contratual (ID 27088030), além de comprovante de transferência bancária (TED) do valor contratado em favor do consumidor, circunstâncias que demonstram a regularidade do negócio jurídico (ID 27088032).
Desse modo, ausente o requisito essencial à configuração do dever de indenizar — qual seja, o dano efetivamente sofrido —, não há que se falar em reparação por danos morais ou em repetição do indébito, tampouco em declaração de inexistência de débito, visto que o contrato sequer foi formalizado de modo a gerar obrigações entre as partes.
No mesmo sentido é a jurisprudência desta Egrégia Câmara:
APELAÇÃO CÍVEL. INEXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO. PROPOSTA EXCLUÍDA. DESCONTOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. NÃO COMPROVADOS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. No caso, cinge-se a controvérsia acerca da pretensão da parte recorrente em ver reconhecida a nulidade da contratação realizada entre as partes. 2. Preambularmente, não há dúvida de que a referida lide, por envolver a discussão acerca de falha na prestação de serviços, é regida pela ótica do Código de Defesa do Consumidor, conforme a Súmula 297, STJ, para impor a instituição financeira o ônus de provar. 3. Há nos autos, porém, provas juntadas pela Autora e pelo Banco que mostram a inocorrência de descontos no benefício previdenciário, razão pela qual deve ser declarado inexistente a avença, bem como os danos materiais e morais, uma vez que ausentes os descontos ou prejuízos para a parte Autora, ora Apelante. 4. Litigância de má-fé reconhecida. 5. Recurso conhecido e desprovido. (TJPI | Apelação Cível Nº 0802525-75.2021.8.18.0076 | Relator: José Wilson Ferreira de Aguiar Júnior | 2ª CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL | Data de Julgamento: 30/06/2023)
Em face das razões acima explicitadas, não há que se falar em devolução de valores, tampouco indenização por danos morais, isto porque, sendo a contratação excluída antes do primeiro desconto, afasta-se a possibilidade de concessão da indenização pretendida, já que inexiste compromisso e, por óbvio, situação de fraude, erro ou coação.
Assim sendo, não se vislumbra qualquer irregularidade ou ilicitude apta a ensejar reforma da sentença vergastada, que deve ser mantida por seus próprios fundamentos.
IV – DISPOSITIVO
Por todo o exposto, voto pelo CONHECIMENTO do recurso para, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, mantendo a sentença incólume em todos os seus termos.
Por fim, majoro os honorários de sucumbência recursal em 2% sobre o valor da causa, mantendo, contudo, a sua exequibilidade suspensa em razão da concessão dos benefícios da Justiça Gratuita
Ressalto, ainda, que a interposição de Agravo Interno com o único objetivo de atrasar o andamento processual, se julgado inadmissível ou improcedente por unanimidade, nos termos do § 4º do art. 1.021, do CPC, poderá acarretar a aplicação de multa de 1% (um por cento) a 5% (cinco por cento) sobre o valor atualizado da causa.
Intimem-se as partes.
Transcorrendo in albis o prazo recursal, arquivem-se os autos, dando-se baixa na distribuição.
Teresina, Data do sistema.
Des. José Wilson Ferreira de Araújo Júnior
0802816-34.2024.8.18.0088
Órgão JulgadorDesembargador JOSÉ WILSON FERREIRA DE ARAÚJO JÚNIOR
Órgão Julgador Colegiado2ª Câmara Especializada Cível
Relator(a)JOSE WILSON FERREIRA DE ARAUJO JUNIOR
Classe JudicialAPELAÇÃO CÍVEL
CompetênciaCâmaras Cíveis
Assunto PrincipalEmpréstimo consignado
AutorJOSE MIGUEL MENDES DA ROCHA FILHO
RéuBANCO OLE BONSUCESSO CONSIGNADO S.A.
Publicação27/08/2025