poder judiciário
tribunal de justiça do estado do piauí
GABINETE DO Desembargador ANTONIO LOPES DE OLIVEIRA
PROCESSO Nº: 0753725-79.2023.8.18.0000
CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202)
ASSUNTO(S): [Cabimento]
AGRAVANTE: BANCO DO NORDESTE DO BRASIL SA
AGRAVADO: AILA MARIA GOMES DOS SANTOS
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO ELETRÔNICO. AUSÊNCIA DE IDENTIFICAÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. INÉRCIA DA PARTE AGRAVANTE EM SANAR O VÍCIO APÓS DUPLA INTIMAÇÃO. NÃO JUNTADA DE DOCUMENTOS ESSENCIAIS À FORMAÇÃO DO INSTRUMENTO RECURSAL, CONFORME ART. 1.017 DO CPC. ÔNUS PROCESSUAL NÃO CUMPRIDO. RECURSO INADMISSÍVEL. NÃO CONHECIMENTO.
A interposição de Agravo de Instrumento, ainda que em autos eletrônicos, exige a clara identificação da decisão interlocutória impugnada e a correta instrução do recurso com as peças essenciais, conforme o rol do Art. 1.017 do Código de Processo Civil. A ausência de identificação da decisão agravada, somada à inércia da parte agravante em sanar o vício após duas oportunidades de regularização, bem como a não comprovação da juntada de todos os documentos necessários à formação do instrumento, configura descumprimento de ônus processual e impede o conhecimento do recurso, nos termos do Art. 932, inciso III, c/c parágrafo único, do Código de Processo Civil.
DECISÃO TERMINATIVA
RELATÓRIO
Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por BANCO DO NORDESTE DO BRASIL SA contra AILA MARIA GOMES DOS SANTOS, visando a reforma de decisão interlocutória proferida pelo juízo de primeira instância nos autos da Ação de Execução nº 0003375-92.2006.8.18.0140.
A parte agravante, em sua petição inicial recursal, datada de 25 de abril de 2023, alegou que a decisão recorrida teria determinado a suspensão do feito executivo com base no art. 921, III e § 1º, do Código de Processo Civil, sob a premissa de inexistência de bens penhoráveis da parte executada. Sustentou, em síntese, que não teriam sido esgotadas todas as medidas de busca de bens, como a consulta ao sistema INFOJUD, e que a decisão seria prematura e contraditória.
Distribuído o recurso a esta Relatoria, em análise preliminar dos autos eletrônicos, verificou-se a impossibilidade de identificar, de forma inequívoca, a decisão interlocutória que era objeto do presente agravo. Além disso, constatou-se que o instrumento recursal não estava devidamente instruído com todas as peças essenciais exigidas pelo Art. 1.017 do Código de Processo Civil, notadamente a própria decisão agravada e a certidão de sua respectiva intimação, documentos cruciais para a verificação da tempestividade e do objeto do recurso.
Diante dessas constatações, e em observância ao princípio da primazia do julgamento do mérito, foi proferido despacho em 5 de julho de 2023 (Id. 12135074), determinando à Coordenadoria Judiciária Cível que intimasse a parte agravante para que informasse, no prazo legal, qual seria a decisão agravada e para que regularizasse a instrução do recurso com as peças faltantes.
A intimação da parte agravante foi devidamente realizada em 27 de agosto de 2023 (Id. 12973391). Contudo, a parte agravante permaneceu inerte, não apresentando a informação solicitada ou qualquer manifestação que pudesse sanar os vícios apontados na formação do agravo.
Em razão da persistência das omissões, novo despacho foi proferido em 26 de março de 2024 (Id. 16111320), reiterando a intimação da parte agravante para que se manifestasse, no prazo de cinco (05) dias, acerca da suposta ausência de interesse recursal e da irregularidade na formação do instrumento recursal.
A intimação referente a este segundo despacho foi efetivada em 2 de abril de 2024 (Id. 16264358). Mais uma vez, a parte agravante deixou de se manifestar, mantendo-se inerte e não providenciando a regularização do recurso, seja pela identificação da decisão agravada, seja pela juntada das peças essenciais.
É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
A admissibilidade do Agravo de Instrumento, como de qualquer recurso, está condicionada ao preenchimento de requisitos extrínsecos e intrínsecos, cuja observância é imperativa para o regular desenvolvimento do processo e para a garantia da segurança jurídica. Dentre os requisitos extrínsecos, destaca-se a regularidade formal e a correta formação do instrumento recursal.
O Art. 1.017 do Código de Processo Civil estabelece o rol de documentos que devem instruir o Agravo de Instrumento, a saber:
Art. 1.017, CPC
"A petição de agravo de instrumento será instruída: I - obrigatoriamente, com cópias da petição inicial, da contestação, da petição que ensejou a decisão agravada, da própria decisão agravada, da certidão da respectiva intimação ou outro documento oficial que comprove a tempestividade e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado; II - com declaração de inexistência de qualquer dos documentos referidos no inciso I, feita pelo próprio advogado do agravante, sob pena de sua responsabilidade pessoal; III - facultativamente, com outras peças que o agravante reputar úteis."
Embora o § 5º do referido artigo preveja que "sendo eletrônicos os autos do processo, dispensam-se as peças referidas nos incisos I e II do caput, facultando-se ao agravante anexar outros documentos que entender úteis", essa dispensa não exime a parte agravante do ônus de identificar de forma clara e inequívoca a decisão que se pretende impugnar e de garantir que o tribunal tenha acesso a todos os elementos necessários para a análise da admissibilidade e do mérito do recurso. A dispensa de juntada de cópias não se confunde com a dispensa da existência ou da identificação dos documentos essenciais.
No presente caso, conforme detalhado no relatório, a petição inicial do agravo não permitiu a identificação precisa da decisão interlocutória impugnada. Mais grave ainda, a parte agravante não logrou êxito em comprovar a juntada de todos os documentos essenciais, como a própria decisão agravada e a certidão de sua intimação, elementos indispensáveis para a verificação da tempestividade do recurso e para a delimitação do objeto recursal. A ausência desses documentos, mesmo em autos eletrônicos, impede o juízo de admissibilidade do agravo.
A decisão agravada é o objeto material do agravo de instrumento; sem a sua clara identificação e a comprovação de sua intimação, não há o que ser revisto ou reformado, e a tempestividade do recurso não pode ser aferida. A parte agravante tem o ônus de delimitar o ato judicial que pretende impugnar e de instruir o recurso de forma a permitir que o Tribunal ad quem exerça seu juízo de admissibilidade e, posteriormente, de mérito.
Em observância ao princípio da primazia do julgamento do mérito e da cooperação processual, consagrado no art. 6º do CPC, esta Relatoria concedeu à parte agravante a oportunidade de sanar os vícios. O parágrafo único do art. 932 do CPC é cristalino ao dispor que:
Art. 932, Parágrafo Único, CPC
"Antes de considerar inadmissível o recurso, o relator concederá o prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível."
No caso em tela, a parte agravante foi intimada por duas vezes para regularizar a situação: primeiro, para informar a decisão agravada e instruir o recurso com as peças faltantes (Id. 12135074 e Id. 12973391); e, posteriormente, para se manifestar sobre a ausência de interesse recursal e a irregularidade na formação do instrumento (Id. 16111320 e Id. 16264358). Em ambas as oportunidades, a parte agravante permaneceu inerte, demonstrando desídia no cumprimento de um ônus processual essencial.
A jurisprudência pátria, inclusive dos Tribunais Superiores, é pacífica no sentido de que a inércia da parte em sanar vícios de admissibilidade, após a concessão de prazo para regularização, implica o não conhecimento do recurso. A ausência de identificação da decisão agravada e a não juntada das peças essenciais, mesmo em autos eletrônicos, impede a verificação da adequação do recurso e a análise de seu mérito, configurando, portanto, sua inadmissibilidade.
Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL . AGRAVO DE INSTRUMENTO. AUSÊNCIA DE CÓPIA DA DECISÃO AGRAVADA. PEÇA OBRIGATÓRIA. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO . AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1. Agravo interno contra decisão da Presidência que não conheceu do agravo em recurso especial. Reconsideração . 2. Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, "a cópia da decisão agravada em sua íntegra é peça obrigatória à formação do agravo de instrumento, a teor do disposto no art. 525, caput e inciso I, do Código de Processo Civil de 1973 (art. 1 .017, I, do CPC/2015), sendo inaplicável o princípio da instrumentalidade das formas" (AgInt no AREsp 985.406/RJ, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, Segunda Turma, DJe de 07/06/2019). Nesse sentido: AgInt no AREsp 152 .942/RS, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (Desembargador Federal convocado do TRF/5ª Região), Quarta Turma, DJe de 09/02/2018; AgInt no REsp 1.571.772/MG, Rel . Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Quarta Turma, DJe de 19/06/2017; AgRg no REsp 1.509.234/PE, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Terceira Turma, DJe de 11/06/2015 . 3. Agravo interno provido para conhecer do agravo e negar provimento ao recurso especial. (STJ - AgInt no AREsp: 1647673 MG 2020/0006794-4, Relator.: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 29/06/2020, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/08/2020)
O Tribunal de Justiça do Piauí também se alinha a essa compreensão, exigindo a correta formação do instrumento recursal:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AUSÊNCIA DE PEÇA ESSENCIAL AO CONHECIMENTO DA CAUSA. INOBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ART . 525, II, DO CPC. JUNTADA POSTERIOR. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO NÃO CONHECIDO 1 . O Agravo de instrumento deve ser instruído com as peças obrigatórias e as essenciais ao exame da questão controvertida (art. 525, I e II, do CPC). 2. É dever da parte agravante zelar pela correta formação do instrumento de agravo, apresentando, juntamente com a petição do recurso, as peças obrigatórias e essenciais . 3. Nos termos do art. 525, II, do CPC, a ausência de peça essencial ao exame da controvérsia obsta o conhecimento do Agravo de Instrumento, por instrução deficiente. 4 . Inviável a juntada posterior de tais documentos. 5. Recurso não conhecido. O Agravo de instrumento deve ser instruído com as peças obrigatórias e as essenciais ao exame da questão controvertida (art . 525, I e II, do CPC). 2. É dever da parte agravante zelar pela correta formação do instrumento de agravo, apresentando, juntamente com a petição do recurso, as peças obrigatórias e essenciais. 3 . Nos termos do art. 525, II, do CPC, a ausência de peça essencial ao exame da controvérsia obsta o conhecimento do Agravo de Instrumento, por instrução deficiente. 4. Inviável a juntada posterior de tais documentos . 5. Recurso não conhecido. (TJPI | Agravo de Instrumento Nº 2013.0001 .005924-4 | Relator.: Des. Oton Mário José Lustosa Torres | 4ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 19/11/2013 ) (TJ-PI - AI: 201300010059244 PI 201300010059244, Relator: Des. Oton Mário José Lustosa Torres, Data de Julgamento: 19/11/2013, 4ª Câmara Especializada Cível)
A dupla omissão da parte agravante – tanto na identificação da decisão agravada quanto na instrução completa do recurso com as peças exigidas pelo Art. 1.017 do CPC, mesmo após reiteradas oportunidades de regularização – inviabiliza o prosseguimento do agravo.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, com fundamento no art. 932, inciso III, do Código de Processo Civil, NÃO CONHEÇO do presente Agravo de Instrumento, em razão da ausência de identificação da decisão agravada e da inércia da parte agravante em sanar os vícios de instrução do recurso, mesmo após dupla e regular intimação.
Custas processuais pela parte agravante.
Comunique-se esta decisão ao juízo de origem.
Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, observadas as formalidades legais.
Publique-se. Intime-se. Cumpra-se.
TERESINA-PI, 26 de agosto de 2025.
0753725-79.2023.8.18.0000
Órgão JulgadorDesembargador ANTONIO LOPES DE OLIVEIRA
Órgão Julgador Colegiado1ª Câmara Especializada Cível
Relator(a)ANTONIO LOPES DE OLIVEIRA
Classe JudicialAGRAVO DE INSTRUMENTO
CompetênciaCâmaras Cíveis
Assunto PrincipalCabimento
AutorBANCO DO NORDESTE DO BRASIL SA
RéuAILA MARIA GOMES DOS SANTOS
Publicação26/08/2025