PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ
GABINETE DA DESEMBARGADORA LUCICLEIDE PEREIRA BELO
ÓRGÃO JULGADOR: 3ª Câmara Especializada Cível
APELAÇÃO CÍVEL (198) No 0802449-38.2022.8.18.0069
APELANTE: ROSILDA FERREIRA DA COSTA SOUSA
APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A
RELATOR(A): Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. NEGATIVA DE CONTRATAÇÃO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. BANCO DESINCUMBE-SE DO ÔNUS PROBATÓRIO. CONTRATO ELETRÔNICO. USO DE SENHA E CARTÃO PESSOAL. COMPROVANTE DE PAGAMENTO ACOSTADO AOS AUTOS. INEXISTÊNCIA DE FRAUDE. APLICAÇÃO DA SÚMULA 40 TJPI. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS AUTORAIS MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
DECISÃO MONOCRÁTICA
1. RELATÓRIO
Vistos.
Trata-se de Apelação Cível interposta por ROSILDA FERREIRA DA COSTA SOUSA contra a sentença proferida nos autos da AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, movida em face de BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S/A, nos seguintes termos:
Isto posto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos da inicial, EXTINGUINDO o processo COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do inciso I do artigo 487 do CPC/2015.
CONDENO a parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, no importe de 10% do valor da causa, que, todavia, ficam com a exigibilidade suspensa, ante a gratuidade de justiça.
Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com baixa na distribuição.
PRI e Cumpra-se.
Em suas razões recursais, a parte a apelante aduz, em síntese, a inexistência/invalidade do negócio jurídico subjacente, bem como a ocorrência de dano material e moral. Requer a inversão do julgado.
Foram apresentadas contrarrazões.
Desnecessário o encaminhamento dos autos ao Ministério Público Superior, por se não vislumbrar hipótese que justifique sua intervenção.
É o que basta relatar. Decido.
2. FUNDAMENTAÇÃO
JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE
Recurso tempestivo e formalmente regular. Gratuidade deferida na origem. Preenchidos os demais requisitos necessários à admissibilidade recursal, CONHEÇO do apelo.
PRELIMINAR
Não há.
MÉRITO
Visa a demanda à declaração de inexistência/nulidade de contrato de empréstimo consignado cumulada com repetição de indébito em dobro e indenização por danos morais.
De início, destaco que o artigo 932 do Código de Processo Civil (CPC) versa sobre a competência delegada ao Relator para a prática de atos processuais. Dentre eles, existe a possibilidade de julgamento monocrático do recurso.
Dispõe o artigo 932, inciso IV, do CPC, o seguinte:
Art. 932. Incumbe ao relator:
(...)
IV - negar provimento a recurso que for contrário a:
a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;
b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
Tal previsão encontra-se, ainda, constante no artigo 91, inciso VI-A, do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça (RITJPI), senão vejamos:
Art. 91. Compete ao Relator, nos feitos que lhe forem distribuídos, além de outros deveres legais e deste Regimento:
(...)
VI-A - negar provimento a recurso que for contrário a súmula ou acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; (Redação dada pelo art. 1º da Resolução nº 21, de 15/09/2016)
Sobre o cerne do recurso em apreço, constato que esta Corte possui a Súmula nº 40 no sentido de que “A responsabilidade da instituição financeira deve ser afastada quando o evento danoso decorre de transações que, embora contestadas, são realizadas com a apresentação física do cartão original e mediante uso de senha pessoal do correntista, restando, ainda, comprovado a disponibilização dos valores na conta corrente do postulante”.
Diante da existência da referida súmula e da previsão do artigo 932, inciso IV, do CPC, é possível o julgamento monocrático por esta relatoria.
Ressalto que a matéria em discussão é regida pelas normas pertinentes ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), porquanto a instituição financeira caracteriza-se como fornecedor de serviços, nos termos do artigo 3º, in verbis:
Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Além disso, há entendimento sumulado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), senão vejamos a sua Súmula nº 297:
Súmula nº 297 do STJ: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.
Cinge-se a controvérsia acerca da regularidade de suposta contratação realizada diretamente em caixa eletrônico com utilização de cartão e senha do contratante.
Sobre o tema, é imprescindível que se reconheça a vulnerabilidade do consumidor. De acordo com Cláudia Lima Marques, “a vulnerabilidade é uma situação permanente ou provisória, individual ou coletiva, que fragiliza, enfraquece o sujeito de direitos, desequilibrando a relação de consumo” (BENJAMIN, Antonio Herman V., et al. Manual de direito do consumidor. 4ª. ed.).
A hipossuficiência é a fraqueza do consumidor, isto é, a carência econômica e técnico-científico, sendo o primeiro relacionado com a diferença do poder econômico do consumidor face ao fornecedor, e o segundo relativo ao desconhecimento técnico do produto.
A inversão do ônus da prova não é feita de forma automática, ou seja, não constitui princípio absoluto. Trata-se de distribuição ope judicis, a cargo do juiz.
Neste mesmo sentido, é o entendimento sumulado deste Egrégio Tribunal de Justiça:
Súmula nº 26 do TJPI: Nas causas que envolvem contratos bancários, aplica-se a inversão do ônus da prova em favor do consumidor (CDC, art, 6º, VIII) desde que comprovada sua hipossuficiência em relação à instituição financeira, entretanto, não dispensa que o consumidor prove a existência de indícios mínimos do fato constitutivo de seu direito, de forma voluntária ou por determinação do juízo.
No caso em apreço, constato que o contrato questionado foi realizado diretamente em terminal de autoatendimento (caixa eletrônico).
Neste ponto, insta salientar que a contratação de empréstimo consignado em terminal de autoatendimento consiste em serviço facilitado disponível ao cliente do banco que, apesar de não assinar instrumento contratual, manifesta o interesse de contratar ao concluir a operação financeira mediante utilização de biometria e/ou de senha pessoal.
Em se tratando de contração de empréstimo bancário por meio eletrônico, admite-se que a existência e validade do negócio seja comprovada por meio de um conjunto consistente de elementos probatórios, incluindo os extratos e informações extraídos do sistema interno dos bancos, desde que apoiados em outros elementos de prova, sobretudo quando a pretensão da autora está amparada em única e exclusiva negativa de contratação do serviço.
Nesse sentido, é o entendimento desta Corte, que possui, como visto, súmula pela validade das contratações realizadas em caixa eletrônico, mediante uso de cartão bancário com chip e de senha pessoal. Relembre-se:
Súmula nº 40 do TJPI: A responsabilidade da instituição financeira deve ser afastada quando o evento danoso decorre de transações que, embora contestadas, são realizadas com a apresentação física do cartão original e mediante uso de senha pessoal do correntista, restando, ainda, comprovado a disponibilização dos valores na conta corrente do postulante.
De mais a mais, observo que a parte apelada anexou o extrato bancário que demonstra o depósito da quantia contratada (ids nºs 20616812 e 20616813), o que evidencia a existência de relação jurídica entre as partes.
Nessa direção, o juízo sentenciante frisou:
(...) Cumpre destacar que, apesar de suas alegações, resta comprovado que a parte autora foi, indubitavelmente, a beneficiária do contrato de empréstimo formulado, haja vista o extrato bancário apresentado pelo demandado (id. 37819078), que confirma o recebimento do valor contratado, restando demonstrado que no contrato de n. 0123448891414, objeto da presente lide, foram creditados, como valor líquido do empréstimo R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais) em conta bancária de titularidade da parte autora junto ao Banco Bradesco (agência n. 5791-6, conta n. 9564-8, no dia 25/11/2021).
Portanto, o argumento de que a parte autora foi objeto de esquema fraudulento não se sustenta, vez que o comprovante de ordem de pagamento do valor contratado à conta de titularidade da parte autora constitui prova cabal de que o crédito referente ao contrato foi recebido pelo postulante, inferindo-se que realmente houve legal contratação. (...).
Em corroboração, apresentou-se log da contratação (id nº 20616814).
Havendo a comprovação da contratação, que possui o condão de autorizar os descontos relativos ao empréstimo, a improcedência se impõe, não havendo se falar em violação ao direito de informação e em nulidade do contrato.
Some-se a isso, a propósito, que o contrato objeto da ação foi, há muito, excluído, pois, de acordo com o extrato do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o Contrato nº 012344889141 4 foi incluído em 25/11/2021 e excluído em 28/01/2022, em razão de financiamento (id nº 20616799).
Nesse contexto, como acima delineado, a manutenção da sentença recorrida é medida de rigor.
3. DISPOSITIVO
Ante o exposto, pelas razões declinadas, conforme o art. 932, IV, “a”, do CPC, CONHEÇO do recurso, para NEGAR-LHE PROVIMENTO.
Majoro os honorários advocatícios para 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, que, no entanto, ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade, pelo prazo de 05 (cinco) anos, em conformidade com o artigo 98, § 3º, do mesmo diploma legal.
Preclusas as vias impugnativas, dê-se baixa na distribuição, com a consequente remessa dos autos ao juízo de origem.
Teresina, 09 de janeiro de 2025.
Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO
Relatora
0802449-38.2022.8.18.0069
Órgão JulgadorDesembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO
Órgão Julgador Colegiado3ª Câmara Especializada Cível
Relator(a)LUCICLEIDE PEREIRA BELO
Classe JudicialAPELAÇÃO CÍVEL
CompetênciaCâmaras Cíveis
Assunto PrincipalEmpréstimo consignado
AutorROSILDA FERREIRA DA COSTA SOUSA
RéuBANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A
Publicação09/01/2025