Decisão Terminativa de 2º Grau

Crimes previstos na Lei da Organização Criminosa 0768346-47.2024.8.18.0000


Decisão Terminativa

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ

GABINETE DES. SEBASTIÃO RIBEIRO MARTINS



HABEAS CORPUS Nº 0768346-47.2024.8.18.0000

Órgão Julgador: 1ª CÂMARA ESPECIALIZADA CRIMINAL

Origem: VARA DE DELITOS DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA - PI

Impetrante: GERSON HENRIQUE SILVA SOUSA (Defensor Público)

Paciente: PAMILA TYSIANE SALES DOS SANTOS

Relator: DES. SEBASTIÃO RIBEIRO MARTINS



EMENTA

DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ALEGAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA TERRITORIAL. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA PROTOCOLADA FORA DOS AUTOS APARTADOS. REJEIÇÃO PELO JUÍZO ORIGINÁRIO. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.

I. CASO EM EXAME

1. Habeas Corpus, com pedido liminar, impetrado pela Defensoria Pública em favor de investigada pelos crimes de estelionato (art. 171, §4º, do CP) e lavagem de dinheiro (art. 1º, II, da Lei nº 9.613/98), alegando nulidade na decisão que rejeitou exceção de incompetência territorial, sob o argumento de que a petição foi protocolada fora dos autos apartados.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se houve ilegalidade na rejeição da exceção de incompetência por descumprimento do art. 111 do CPP, que exige autuação em apartado; (ii) avaliar se a referida rejeição caracteriza flagrante ilegalidade apta a justificar a concessão do Habeas Corpus.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3. A rejeição da exceção de incompetência territorial decorre da ausência de cumprimento da formalidade prevista no art. 111 do CPP, que exige sua autuação em autos apartados.

4. O magistrado de primeiro grau intimou a defesa para sanar o vício formal, mas a parte permaneceu inerte, implicando na preclusão do direito de arguir a incompetência territorial, que possui natureza relativa e não pode ser reconhecida de ofício.

5. A ausência de flagrante ilegalidade na decisão que rejeitou a exceção de incompetência inviabiliza o manejo do Habeas Corpus, consoante jurisprudência consolidada do STJ e dos Tribunais Regionais Federais.

6. A decisão que rejeita exceção de incompetência territorial não admite recurso, salvo em situações de manifesta ilegalidade, sendo possível suscitar a matéria em preliminar de eventual recurso de apelação, conforme precedentes aplicáveis.

IV. DISPOSITIVO E TESE

7. Habeas Corpus não conhecido.

Tese de julgamento: “1. A exceção de incompetência territorial, por possuir natureza relativa, deve ser argüida no prazo e na forma previstos no art. 108 e no art. 111 do CPP, sendo vedado o reconhecimento de 


ofício pelo magistrado. 2. A ausência de flagrante ilegalidade na rejeição de exceção de incompetência territorial inviabiliza a concessão de Habeas Corpus, nos termos da jurisprudência consolidada.”

Dispositivos relevantes citados: CPP, arts. 70, 108 e 111; Lei nº 14.155/2021.

Jurisprudência relevante citada: TRF-1, EXINC nº 0006302-41.2010.4.01.4200, Rel. Des. Fed. Assusete Magalhães, j. 01/03/2011; TJ-MG, APR nº 10024075797852002, Rel. Pedro Vergara, j. 07/07/2009; STJ, HC nº 162.176/PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 26/04/2011.


DECISÃO:

Trata-se de HABEAS CORPUS, com pedido de medida liminar, impetrado pelo Defensor Público GERSON HENRIQUE SILVA SOUSA (Defensor Público), em benefício de PAMILA TYSIANE SALES DOS SANTOS, qualificada e representada nos autos, investigada pela prática dos delitos de estelionato (artigo 171, §4º, do Código Penal) e de lavagem de dinheiro (artigo 1º, II, da Lei nº 9.613/98).

O impetrante aponta como autoridade coatora o MM. Juiz de Direito da Vara de Delitos de Organização Criminosa - PI.

Aduz a defesa que arguiu exceção de incompetência do Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Teresina- PI para processar e julgar o caso dos autos nº 0001760-76.2020.8.18.0140, tendo sendo indeferido pelo magistrado de primeiro grau, sob o fundamento de não ter sido apresentada em autos apartados.

Sustenta que “Tal decisão caracteriza-se como indevida formalidade excessiva, afrontando o princípio da instrumentalidade das formas e o dever de apreciação do mérito, além de comprometer direitos constitucionais da paciente.” 

Requer, liminarmente, a suspensão do processo originário até o julgamento definitivo deste Habeas Corpus, assegurando-se o direito da Paciente ao devido processo legal. No mérito, vindica o reconhecimento da nulidade do indeferimento da exceção de incompetência apresentada, determinando-se sua análise imediata pela autoridade coatora, mesmo que nos autos principais;

Colaciona aos autos os documentos de ID 22104766 a 22104770.

Eis um breve relatório. 

O instituto do Habeas Corpus é um remédio constitucional que visa tutelar a liberdade física do indivíduo, fazendo cessar a violência ou a coação à liberdade de locomoção decorrente de ilegalidade ou abuso de poder, nos termos do art. 5º, LXVIII, da CF/88, c/c art. 647, do Código de Processo Penal.

Inicialmente, insta consignar que não há recurso previsto legalmente contra a decisão que rejeita a exceção de incompetência.

Sobre o tema leciona GUILHERME DE SOUSA NUCCI:


“No caso do juiz concluir pela competência do juízo, não há recurso, salvo se a decisão for de flagrante ilegalidade, podendo-se ingressar com habeas corpus, pois o réu não deve ser processado senão pelo juiz natural.” Guilherme de Souza Nucci (in: Código de Processo Penal Comentado, 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 908)


Nesse mesmo sentido, é entendimento pacífico na jurisprudência o cabimento do Habeas Corpus, em caso de flagrante ilegalidade, para análise e discussão do caso, conforme os julgados abaixo:


PENAL E PROCESSUAL PENAL - EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA - REJEIÇÃO, PELO JUÍZO A QUO - IRRECORRIBILIDADE DA DECISÃO QUE REJEITA A EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA - REMESSA DOS AUTOS DA EXCEÇÃO AO TRF/1ª REGIÃO - INCOMPETÊNCIA DA CORTE PARA APRECIAR ORIGINARIAMENTE A EXCEÇÃO - NÃO CONHECIMENTO DO INCIDENTE. 

I - Rejeitada a exceção de incompetência, o Juiz permanece no feito, nos termos do art. 108 do CPP, inexistindo previsão legal de recurso contra a aludida decisão. 

II - "Da decisão que rejeita exceção de incompetência não cabe recurso. Resta à parte a impetração de habeas corpus, em caso de flagrante ilegalidade, inocorrente na hipótese, ou argüir a questão como preliminar em eventual recurso de apelação. Não provimento do recurso em sentido estrito interposto contra a decisão que não recebeu a apelação que impugnava a rejeição da exceção de incompetência." 

III - No caso dos autos, apesar de não ter havido a interposição de recurso voluntário, contra a decisão do Juízo a quo que rejeitou a exceção de incompetência - recurso, aliás, incabível -, foram os autos remetidos a esta Corte, a qual não tem competência originária para apreciar a questão. 

IV - Exceção de Incompetência não conhecida.

(TRF-1 - EXINC: 6302 RR 0006302-41.2010.4.01.4200, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Julgamento: 01/03/2011, TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: e-DJF1 p.55 de 18/03/2011)


PENAL - TRÁFICO DE DROGAS - EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA REJEITADA - INTERPOSIÇÃO DE APELAÇÃO - PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO - ACOLHIDA - NÃO CABE RECURSO DE APELAÇÃO CONTRA DECISÃO QUE REJEITA EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA - PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE - IMPOSSIBILIDADE -RECURSO NÃO CONHECIDO.

- Da decisão que rejeita exceção de incompetência não cabe recurso. Resta à parte a impetração de Habeas corpus, ou arguir a questão como preliminar em eventual recurso de apelação.

(TJ-MG - APR: 10024075797852002 Belo Horizonte, Relator: Pedro Vergara, Data de Julgamento: 07/07/2009, Câmaras Criminais Isoladas / 5ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 20/07/2009)


PROCESSUAL PENAL. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA. REJEIÇÃO NO JUÍZO MONOCRÁTICO. INEXISTÊNCIA DE RECURSO PRÓPRIO CABÍVEL. MATÉRIA SUSCITADA EM PRELIMINAR DA APELAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECLUSÃO. AUSÊNCIA.

1 - Contra a decisão do juízo monocrático que rejeita a exceção de incompetência, não cabe recurso em sentido estrito, podendo, então, o édito ser confrontado por meio de habeas corpus, se presentes os seus requisitos, ou suscitada a questão nos autos, em preliminar, conforme ocorreu in casu.

2 - Na hipótese, por óbvio, não há falar em preclusão da matéria relativa à competência, dado que foi suscitada no momento próprio e ainda renovada em alegações finais da defesa e em preliminar da apelação.

3 - Ordem concedida para que o Tribunal de origem decida a questão da competência.

(HC n. 162.176/PR, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 26/4/2011, DJe de 11/5/2011.)


Isso posto, passa-se à análise do caso concreto, a fim de verificar a ocorrência de flagrante ilegalidade passível de apreciação no presente remédio constitucional.

No caso dos autos, o magistrado de primeiro grau rejeitou a exceção de incompetência nos seguintes termos:


Em ID 50974167 a defesa de Pamila Tysiane Sales dos Santos apresentou exceção de incompetência com a alegação de que nenhum dos supostos estelionatários possuía conta bancária em agência vinculada a Comarca de Teresina/PI, ou seja, a ação penal não poderia ter tramitado neste juízo, pois a competência seria estabelecida pela redação do Art. 70 do CPP na forma anterior à vigência da Lei nº 14.155/2021. 

O MPPI requereu que a exceção fosse autuada em apartado. 

O Despacho de ID 58779440 determinou a intimação da DPE-PI para que autuasse a petição em processo apartado. A intimação foi realizada em 14/06/2024, ID 58815724, com decurso do prazo em 04/07/2024. 

Destaco que a competência territorial tem natureza relativa, prorrogando-se quando não arguida na oportunidade cabível. Significando dizer, portanto, que eventual inércia, em momento oportuno, da parte interessada, torna inviável declinação posterior de competência, ocorrendo a sua prorrogação em virtude da preclusão. 

Destarte, tratando-se de competência territorial, como é o caso dos autos, cediço que essa não devendo ser reconhecida de ofício, mas arguida pela parte no momento (prazo de defesa) e nas formas adequadas (exceção de incompetência), consoante se extrai dos arts. 108 e 111 do CPP. In verbis:

 Art. 108. A exceção de incompetência do juízo poderá ser oposta, verbalmente ou por escrito, no prazo de defesa. 

§ 1º Se, ouvido o Ministério Público, for aceita a declinatória, o feito será remetido ao juízo competente, onde, ratificados os atos anteriores, o processo prosseguirá. 

§ 2º Recusada a incompetência, o juiz continuará no feito, fazendo tomar por termo a declinatória, se formulada verbalmente. 

Art. 111. As exceções serão processadas em autos apartados e não suspenderão, em regra, o andamento da ação penal. 

A exceção foi protocolada junto da resposta à acusação, o que satisfaz o requisito temporal. No entanto, foi apresentada da forma errada. Por isso, a defesa foi intimada para corrigir o erro e protocolar a autuação em apartado, o que não foi cumprido. 

Dessa forma, rejeito a petição de ID 50974167, por descumprimento do requisito do Art. 111 do CPP.


Verifica-se, portanto, que, em que pese ter feito no prazo legal, a defesa protocolou a exceção de incompetência em desacordo com o art. 111, do Código de Processo Penal, que deve ser processada em apartado.

Ainda, ressalta o magistrado que, intimada para correção do erro, a defesa permaneceu inerte.

Nesse sentido, diante da ausência de flagrante ilegalidade, não deve ser conhecido o presente Habeas Corpus. 

Em face do exposto, NÃO CONHEÇO do presente Habeas Corpus, ao tempo em que DETERMINO o arquivamento dos autos e a consequente baixa no sistema processual eletrônico. 

Teresina, 09 de janeiro de 2025.


Des. SEBASTIÃO RIBEIRO MARTINS

 

Relator


(TJPI - HABEAS CORPUS CRIMINAL 0768346-47.2024.8.18.0000 - Relator: SEBASTIAO RIBEIRO MARTINS - 1ª Câmara Especializada Criminal - Data 09/01/2025 )

Detalhes

Processo

0768346-47.2024.8.18.0000

Órgão Julgador

Desembargador SEBASTIÃO RIBEIRO MARTINS

Órgão Julgador Colegiado

1ª Câmara Especializada Criminal

Relator(a)

SEBASTIAO RIBEIRO MARTINS

Classe Judicial

HABEAS CORPUS CRIMINAL

Competência

Câmaras Criminais

Assunto Principal

Crimes previstos na Lei da Organização Criminosa

Autor

A DEFENSORIA PUBLICA DO ESTADO DO PIAUI

Réu

Juiz da Vara de Delitos de Organização Criminosa de Teresina - PI

Publicação

09/01/2025