Decisão Terminativa de 2º Grau

Empréstimo consignado 0802060-87.2021.8.18.0069


Decisão Terminativa

poder judiciário 
tribunal de justiça do estado do piauí
GABINETE DO Desembargador JOSÉ WILSON FERREIRA DE ARAÚJO JÚNIOR

PROCESSO Nº: 0802060-87.2021.8.18.0069
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
ASSUNTO(S): [Empréstimo consignado]
APELANTE: FRANCISCO ASSIS DE OLIVEIRA
APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A


JuLIA Explica

DECISÃO TERMINATIVA

 

EMENTA. APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMO PESSOAL. TERMINAL DE AUTOATENDIMENTO. CONTRATAÇÃO VIA USO DE CARTÃO MAGNÉTICO E SENHA. VALIDADE. RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE AS PARTES COMPROVADA. COMPROVANTE DE PAGAMENTO JUNTADO. INEXISTÊNCIA DE FRAUDE. APLICAÇÃO DA SÚMULA 40 TJPI. SENTENÇA IMPROCEDENTE MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

 

  

I – RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por Francisco Assis de Oliveira em face da sentença proferida nos autos da Ação Declaratória, promovida em face do Banco Bradesco, em trâmite na Vara única da Comarca de Regeneração-PI, que julgou improcedentes os pedidos iniciais, nos termos do inciso I do artigo 487 do CPC/2015 e condenou a parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, no importe de 10% do valor da causa, que, todavia, ficam com a exigibilidade suspensa, ante a gratuidade de justiça.

Em suas razões (ID. 21520037), a parte Apelante alega a ausência de contrato. Ao fim, pugna pelo provimento do recurso para reformar a sentença julgando procedentes os pedidos iniciais.

A instituição financeira, em contrarrazões (ID. 21520041), afirma a regularidade da contratação, que seu deu na “boca do caixa eletrônico” com a utilização de cartão e senha/biometria.

Em razão da recomendação contida no Ofício-Circular nº 174/2021, os autos deixaram de ser encaminhados ao Ministério Público Superior, por não se vislumbrar hipótese que justificasse a sua intervenção.

É o relatório. 

II – ADMISSIBILIDADE DO RECURSO

Ao analisar os pressupostos objetivos, verifica-se que o recurso interposto é cabível, adequado e tempestivo. Além disso, não se verifica a existência de fato impeditivo de recurso e não ocorreu nenhuma das hipóteses de extinção anômala da via recursal (deserção, desistência e renúncia). Ausente o pagamento de preparo, em virtude de a parte Autora ser beneficiária da justiça gratuita. Ademais, não há como negar o atendimento dos pressupostos subjetivos, pois a parte Autora é legítima e possui interesse recursal.

Desse modo, conheço do recurso interposto.

III FUNDAMENTAÇÃO

Preambularmente, consoante dispõe o art. 932, IV, “a”, do CPC, compete ao relator negar provimento ao recurso que contrariar súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal.

Tal previsão encontra-se, ainda, constante no art. 91, VI-B, do Regimento Interno deste E. Tribunal de Justiça, senão vejamos: 

Art. 91. Compete ao Relator, nos feitos que lhe forem distribuídos, além de outros deveres legais e deste Regimento:

(…)

VI-B - negar provimento a recurso que for contrário a súmula deste Tribunal ou entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; (Incluído pelo art. 1º da Resolução nº 21, de 15/09/2016)

Utilizo-me, pois, de tais disposições normativas, uma vez que a matéria aqui trazida já foi amplamente deliberada nesta Corte de Justiça, possuindo até mesmo disposição de súmula.

Pois bem.

Adianto que não merece reforma a sentença recorrida.

Cumpre esclarecer, inicialmente, que o presente caso deve ser apreciado sob a égide do Código de Defesa do Consumidor – CDC, Lei nº 8.078/90, logo é imprescindível que se reconheça a vulnerabilidade do consumidor.

Nesse sentido, é o entendimento atual, tanto na doutrina como na jurisprudência, acerca da aplicação do CDC às operações bancárias, o que inclusive, restou sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme a redação:

 Súmula 297 – STJ: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.

Nas referidas ações, em regra, é deferida em favor da parte Autora a inversão do ônus da prova, em razão da hipossuficiência técnica financeira, a fim de que a Instituição bancária comprove a existência do contrato, bem como o depósito da quantia contratada.

Esta é uma questão exaustivamente debatida nesta E. Câmara Especializada Cível, possuindo até mesmo disposição expressa na Súmula nº 26 deste TJPI, in litteris:

TJPI/SÚMULA Nº 26 – Nas causas que envolvem contratos bancários, aplica-se a inversão do ônus da prova em favor do consumidor (CDC, art, 6º, VIII) desde que comprovada sua hipossuficiência em relação à instituição financeira, entretanto, não dispensa que o consumidor prove a existência de indícios mínimos do fato constitutivo de seu direito, de forma voluntária ou por determinação do juízo.

Nesse contexto, é imprescindível que se reconheça a vulnerabilidade do consumidor. Contudo, a aplicação da norma consumerista não significa que a demanda promoverá um favorecimento desmedido de um sujeito em prol de outro, pois o objetivo da norma é justamente o alcance da paridade processual.

A instituição financeira aduz que o contrato de empréstimo foi efetuado no BDN, diretamente na boca do caixa eletrônico, modalidade de negócio jurídico válida e que vincula o pagamento das prestações mensais.

Observo, através dos documentos acostados aos autos (ID. 21520024 e ID. 21520025), a disponibilização do numerário na conta-corrente da parte autora, inclusive constando número do contrato, valor do empréstimo pessoal, valor da prestação e número de parcelas a serem pagas.

Não bastasse, foge à razoabilidade o fato de a parte autora ter se insurgido quanto aos descontos, alegando que não celebrou contrato, após ter efetuado o pagamento de inúmeras parcelas, sem qualquer insurgência.

Como sabido, o empréstimo é um acordo firmado entre o cliente e a instituição financeira, pelo qual aquele recebe determinada quantia que será restituída ao banco em prazo pré-estabelecido, acrescida dos juros previamente acertados.

Nestes casos, o pacto não gera documentos físicos, pois concretizado através dos canais de autoatendimento, com aceitação do cliente pelo uso de senha pessoal e intransferível do cartão magnético, cuja guarda e cuidado a ele incumbe. Portanto, a ausência de instrumento formal, em decorrência de contratação por meio eletrônico, não inviabiliza a cobrança de saldo devedor através da via ordinária, bastando que o mutuante comprove a entrega do dinheiro por meio de crédito na conta do mutuário, como no caso em apreço.

Tal modalidade, em verdade, trata-se de serviço facilitado disponível ao cliente do banco que, apesar de não assinar instrumento contratual, manifesta seu interesse de contratar no momento em que conclui a operação financeira mediante a utilização de senha pessoal, como restou comprovado no presente caso.

No mesmo sentido, quanto aos contratos eletrônicos, já se manifestou a jurisprudência desta Corte de Justiça:

PROCESSO CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO. CONTRATO APRESENTADO PELO BANCO. VALIDADE. AUSÊNCIA DE PROVAS DE FRAUDE. PRIMEIRO APELO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. SEGUNDO APELO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Cabível a aplicação do art. 6º, VIII, do CDC relativo à inversão do ônus da prova, considerando-se a capacidade, dificuldade ou hipossuficiência de cada parte, cabendo à instituição financeira o encargo de provar a existência do contrato pactuado, modificativo do direito da autora, segundo a regra do art. 373, II, do CPC. 2. Livrando-se o banco a contento do ônus de comprovar a contratação regular do empréstimo, por meio de extrato bancário e demais movimentações financeiras por parte da autora, bem como do comprovante do depósito do valor contratado, não há que se falar em existência de ilícito. 3. Configurada a ciência dos atos praticados na realização do empréstimo pelas provas colacionadas nos autos e não rechaçadas pela parte contrária. 4. É comum na atualidade a celebração de contratos bancários por meio digital, quer por aplicativos, quer através de terminais de autoatendimento, não sendo possível a apresentação de contrato físico e que mesmo assim não implicam em invalidade, pois exigem o uso de senha pessoal sigilosa para a realização, e até biometria, sendo certo que no caso dos autos não há qualquer indício de fraude. 5. Apelações conhecidas. Provimento recursal da instituição financeira e negado provimento ao recurso da parte autora. (TJPI | Apelação Cível Nº 0800004-90.2020.8.18.0045 | Relator: Fernando Carvalho Mendes | 1ª CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL | Data de Julgamento: 29/10/2021)

Sobre a matéria, ainda, este E. Tribunal de Justiça aprovou o verbete sumular de nº 40, o qual versa sobre o afastamento da responsabilidade das instituições financeiras nos casos em que a contratação foi realizada por meio de senha pessoal e houver demonstrativo da disponibilização do valor contratado, vejamos: 

SÚMULA Nº 40 - A responsabilidade da instituição financeira deve ser afastada quando o evento danoso decorre de transações que, embora contestadas, são realizadas com a apresentação física do cartão original e mediante uso de senha pessoal do correntista, restando, ainda, comprovado a disponibilização dos valores na conta-corrente do postulante. 

Além disso, verifica-se que a instituição bancária juntou extrato bancário (ID 21520025) que comprova o depósito da quantia contratada, o que corrobora a ciência quanto à contratação e eventual uso do crédito contratado.

Desse modo, não há falar em nulidade do empréstimo consignado contratado, tampouco em devolução de valores ou indenização por danos morais.

Assim sendo, não merece reforma a r. sentença recorrida, por qualquer ângulo que se queira dar ênfase, de maneira que se têm como totalmente improcedentes, os argumentos trazidos para apreciação, pela parte apelante.

IV - DISPOSITIVO

Pelo exposto, conheço do recurso, para, no mérito, negar-lhe provimento, com fundamento no art. 932, IV, “a” do CPC, nos termos anteriormente delineados.

Majoro os honorários advocatícios para 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §11, do CPC, que, no entanto, ficarão em condição suspensiva de exigibilidade, pelo prazo de 05 (cinco) anos, em conformidade com o art. 98, § 3º, do CPC.

Intimem-se as partes.

Transcorrido o prazo recursal, arquivem-se os autos, dando-se baixa na distribuição.

Cumpra-se.

 

 

TERESINA-PI, 9 de janeiro de 2025.

(TJPI - APELAÇÃO CÍVEL 0802060-87.2021.8.18.0069 - Relator: JOSE WILSON FERREIRA DE ARAUJO JUNIOR - 2ª Câmara Especializada Cível - Data 09/01/2025 )

Detalhes

Processo

0802060-87.2021.8.18.0069

Órgão Julgador

Desembargador JOSÉ WILSON FERREIRA DE ARAÚJO JÚNIOR

Órgão Julgador Colegiado

2ª Câmara Especializada Cível

Relator(a)

JOSE WILSON FERREIRA DE ARAUJO JUNIOR

Classe Judicial

APELAÇÃO CÍVEL

Competência

Câmaras Cíveis

Assunto Principal

Empréstimo consignado

Autor

FRANCISCO ASSIS DE OLIVEIRA

Réu

BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A

Publicação

09/01/2025