Decisão Terminativa de 2º Grau

Empréstimo consignado 0801818-60.2023.8.18.0069


Decisão Terminativa

 

PODER JUDICIÁRIO 
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ
GABINETE Da DESEMBARGADORA LUCICLEIDE PEREIRA BELO

ORGÃO JULGADOR: 3ª Câmara Especializada Cível

 APELAÇÃO CÍVEL (198) No 0801818-60.2023.8.18.0069

APELANTE: JOSE RIBAMAR DA SILVA

APELADO: BANCO PAN S.A.

RELATOR(A): Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO

 

JuLIA Explica

 

 

 

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. DETERMINAÇÃO DE EMENDA DA INICIAL PARA A JUNTADA DE DOCUMENTOS. INDEFERIMENTO DA INICIAL. DEMANDA PREDATÓRIA. ABUSO DO DIREITO DE ACIONAR O JUDICIÁRIO. PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. INDEFERIMENTO MANTIDO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.  


DECISÃO MONOCRÁTICA

1 - RELATÓRIO


Trata-se de Apelação Cível interposta por JOSÉ RIBAMAR DA SILVA em face da sentença prolatada pelo juízo a quo, nos autos da AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE NEGÓCIO JURÍDICO CC REPETIÇÃO DE INDÉBITO CC COM DANOS MORAIS proposta pela respectiva parte Apelante contra BANCO PAN S.A, ora Apelado. 

A sentença de 1º grau indeferiu a petição inicial e extinguiu o feito sem julgamento de mérito, com fulcro no art. 485, inc. I, do CPC, ante a ausência de emenda à inicial, em desobediência ao despacho proferido. 

Inconformada, a parte autora interpôs Apelação Cível, alegando, em síntese, a desnecessidade de juntada dos documentos solicitados. Por fim, requereu seja dado provimento ao recurso, para anular a sentença e julgar procedentes os pedidos iniciais.

Sem contrarrazões.

É o Relatório.

2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1 - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Recurso tempestivo e formalmente regular. Preenchidos os demais requisitos necessários à admissibilidade recursal, CONHEÇO do apelo.


2.2 - MÉRITO

O art. 932 do CPC prevê a possibilidade do relator proferir decisão monocrática para proceder ao julgamento do recurso nas seguintes hipóteses:

Art. 932. Incumbe ao relator:

IV - negar provimento a recurso que for contrário a:

a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a:

a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;


No presente caso, em que a discussão diz respeito à extinção do feito ante o descumprimento da determinação judicial para juntada de documentos essenciais para o desenvolvimento regular da lide, verifico que a matéria se encontra sumulada no Tribunal de Justiça do Piauí, nos seguintes termos:

SÚMULA 33 - Em caso de fundada suspeita de demanda repetitiva ou predatória, é legítima a exigência dos documentos recomendados pelas Notas Técnicas do Centro de Inteligência da Justiça Estadual Piauiense, com base no artigo 321 do Código de Processo Civil.

Assim, passo a apreciar o mérito do presente recurso, nos termos do art. 932, IV, “a”, CPC.

Pois bem. Conforme exposto, trata-se de demanda envolvendo a temática do empréstimo consignado.

Nesses processos, em regra, observo que a petição inicial possui causa de pedir e pedido idênticos a inúmeras ações com tramitação no âmbito do Poder Judiciário piauiense, sempre questionando de forma exaustiva a existência e/ou validade de contratos firmados com Instituições Financeiras, com pedidos genéricos manifestados em petições padronizadas.

Nesse cenário, surge a possibilidade de caracterização de demanda predatória, que são as judicializações reiteradas e, em geral, em massa, contendo teses genéricas, desprovidas das especificidades do caso concreto, havendo alteração apenas quanto às informações pessoais da parte, de forma a dificultar o exercício do contraditório e da ampla defesa.

Tais demandas acarretam diversas consequências negativas para o Judiciário e, principalmente, o aumento exacerbado do número de processos nas unidades judiciais.

Diante disso, compete ao juiz, o poder/dever de controlar os processos de forma eficiente, diligenciando para que o andamento do caso concreto seja pautado no princípio da boa-fé, evitando os abusos de direitos, buscando identificar a prática de litigância predatória e adotando medidas necessárias para coibi-la.

O Código de Processo Civil, ao dispor sobre os poderes, deveres e responsabilidade do Juiz, determinou no artigo 139 incumbências ao Magistrado, vejamos:

Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:

I - assegurar às partes igualdade de tratamento;

II - velar pela duração razoável do processo;

III - prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias;

IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;

V - promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais;

VI - dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade à tutela do direito;

VII - exercer o poder de polícia, requisitando, quando necessário, força policial, além da segurança interna dos fóruns e tribunais;

VIII - determinar, a qualquer tempo, o comparecimento pessoal das partes, para inquiri-las sobre os fatos da causa, hipótese em que não incidirá a pena de confesso;

IX - determinar o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios processuais;

X - quando se deparar com diversas demandas individuais repetitivas, oficiar o Ministério Público, a Defensoria Pública e, na medida do possível, outros legitimados a que se referem o art. 5º da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985 , e o art. 82 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 , para, se for o caso, promover a propositura da ação coletiva respectiva.

Parágrafo único. A dilação de prazos prevista no inciso VI somente pode ser determinada antes de encerrado o prazo regular.


Dentre elas, friso a hipótese contida no inciso III, que determina ao Magistrado o dever de prevenção ou repressão em face de qualquer ato contrário à dignidade da justiça, assim como o indeferimento de postulações meramente protelatórias.

O poder geral de cautela do Juiz consiste na possibilidade do magistrado adotar medida cautelar assecuratória adequada e necessária, de ofício, ainda que não prevista expressamente no Código de Processo Civil, para garantir o cumprimento das ordens judiciais, de forma a prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e, até mesmo, indeferir postulações meramente protelatórias, conforme se extrai do art. 139, inciso III, do CPC.

Assim, é perfeitamente possível que o magistrado adote providências voltadas ao controle do desenvolvimento válido e regular do processo e acauteladora do próprio direito do demandante, exercida no âmbito do seu poder geral de cautela, exigindo documentos como comprovante de endereço atualizado e extratos bancários em razão de indícios de fraude ou de qualquer outra irregularidade, que, coincidentemente ou não, são comumente vistos em demandas massificadas envolvendo revisão/nulidade de contratos bancários.

No caso em tela, diante da possibilidade de demanda predatória nas ações bancárias envolvendo empréstimo consignado, o Magistrado, utilizando-se do poder/dever de cautela, determinou diligência inicial que, a meu ver, é prudente.

Desta feita, impõe considerar que, tendo em vista o enorme volume de demandas desta natureza, que podem caracterizar lide predatória, a sentença não fere e/ou mitiga o acesso à justiça, nem mesmo o direito a inversão do ônus da prova (efeito não automático), pelo contrário, apenas exige que a parte autora comprove o fato constitutivo do seu direito.

Para corroborar:

TJ-SP - Apelação Cível: AC 10007289420218260646 SP 1000728-94.2021.8.26.0646 - Jurisprudência - Data de publicação: 24/05/2022 - APELAÇÃO. Ação declaratória de inexistência de negócio jurídico cumulada com obrigação de fazer e indenização por danos materiais e morais. Empréstimo consignado. Determinação de emenda da petição inicial para juntada dos extratos bancários e depósito do valor porventura creditado ao autor, bem como apresentação do cálculo atualizado dos valores descontados no benefício previdenciário com a retificação do valor dado à causa. Manifestação do autor recebida como pedido de reconsideração, tendo sido rejeitadas as alegações. Autor que deixou de cumprir as diligências, requerendo dilação petição inicial. Extinção bem decretada. Art. 321 , parágrafo único , do CPC . Inépcia da inicial mantida. Honorários advocatícios fixados ao patrono do apelado. Recurso não provido.

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE CONHECIMENTO DE NATUREZA CONSTITUTIVO-CONDENATÓRIA – DETERMINAÇÃO DE EMENDA A INICIAL PARA JUNTADA DE EXTRATOS DA CONTA CORRENTE NO MÊS CORRESPONDENTE A DO CONTRATO – ALEGAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA TÉCNICA INACEITÁVEL – DOCUMENTO DE FÁCIL OBTENÇÃO NO BANCO, À EXEMPLO DOS EXTRATOS DO INSS, JUNTADOS PELA AUTORA – EXTINÇÃO DO PROCESSO – PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO (ART. 6º, CPC) – RECURSO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. O judiciário não pode ficar à mercê do jurisdicionado. Se a autora não junta no prazo determinado pelo juiz o extrato de sua conta corrente, de curto período e sem custos, sua atitude contraria o princípio da cooperação (art. 6º, CPC). De ver-se, ademais, a incoerência e o comodismo da autora: juntou os extratos do INSS, mas não juntou os extratos da conta-benefício junto ao banco. Assim, ante o descumprimento da determinação judicial em não aditar a inicial, há de se extinguir o processo sem resolução de mérito. (TJMS. Apelação Cível n. 0800150-68.2020.8.12.0023, Angélica, 4ª Câmara Cível, Relator (a): Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva, j: 16/07/2020, p: 21/07/2020).


3 - DISPOSITIVO:

Por todo o exposto, CONHEÇO do Recurso de Apelação para, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, devendo ser mantida a sentença de extinção, por ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo (art. 485, I e IV, do CPC).

Sem condenação em honorários sucumbenciais, eis que não fixados na origem.

Preclusas as vias impugnativas, dê-se baixa na distribuição, com a consequente remessa dos autos ao juízo de origem.

Teresina-PI, 08 de janeiro de 2025.

Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO 

Relatora








(TJPI - APELAÇÃO CÍVEL 0801818-60.2023.8.18.0069 - Relator: LUCICLEIDE PEREIRA BELO - 3ª Câmara Especializada Cível - Data 09/01/2025 )

Detalhes

Processo

0801818-60.2023.8.18.0069

Órgão Julgador

Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO

Órgão Julgador Colegiado

3ª Câmara Especializada Cível

Relator(a)

LUCICLEIDE PEREIRA BELO

Classe Judicial

APELAÇÃO CÍVEL

Competência

Câmaras Cíveis

Assunto Principal

Empréstimo consignado

Autor

JOSE RIBAMAR DA SILVA

Réu

BANCO PAN S.A.

Publicação

09/01/2025