Decisão Terminativa de 2º Grau

Dever de Informação 0800500-49.2022.8.18.0078


Decisão Terminativa

 

PODER JUDICIÁRIO 
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ
GABINETE Da DESEMBARGADORA LUCICLEIDE PEREIRA BELO

ORGÃO JULGADOR: 3ª Câmara Especializada Cível

 APELAÇÃO CÍVEL (198) No 0800500-49.2022.8.18.0078

APELANTE: MARIA BARBOSA DA SILVA

APELADO: BANCO BRADESCO S.A.

RELATOR(A): Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO


JuLIA Explica




EMENTA

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. TARIFAS BANCÁRIAS. AUSÊNCIA DE CONTRATO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. REFORMA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

 

DECISÃO MONOCRÁTICA

 

Vistos.

 

I. Relatório

Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por MARIA BARBOSA DA SILVA contra sentença proferida nos autos da AÇÃO DECLARATÓRIA, ajuizada em face do BANCO BRADESCO S.A., ora apelado.

Em sentença, o d. juízo de 1º grau julgou improcedentes os pedidos, fundamentando que a cobrança de tarifas se apresenta legalmente aceita.

Em suas razões recursais, a apelante alega a não apresentação dos contratos. Requer o provimento do recurso a fim de condenar o banco apelado ao pagamento de danos morais.

Em contrarrazões, o banco sustenta inexistir direito à indenização por danos morais, eis que não restou configurado ato ilícito a ensejá-los. Requer o desprovimento do recurso.

É o relatório.

 

II. Juízo de admissibilidade

Recurso tempestivo e formalmente regular. Preparo dispensado. Justiça gratuita deferida. Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, CONHEÇO do apelo.

 

III. Mérito

O art. 932 do CPC prevê a possibilidade do relator proferir decisão monocrática para proceder ao julgamento do recurso nas seguintes hipóteses:

 

Art. 932. Incumbe ao relator:

V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a:

a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

 

Versa o caso em tela acerca do exame do contrato supostamente firmado entre as partes integrantes da lide.

Resta evidente a hipossuficiência da parte demandante em face da instituição demandada, motivo pelo qual demonstra-se cabível a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC.

Nesse contexto, para demonstrar a existência e a validade do negócio jurídico firmado entre as partes, seria necessário que a requerida, a quem cabe produzir tal prova, apresentasse o respectivo contrato, ora impugnado.

Contudo, a instituição requerida (apelada) não apresentou instrumento contratual relativo ao negócio jurídico objeto da demanda.

Dessa forma, resta afastada a perfectibilidade da relação contratual, ensejando a condenação da instituição requerida ao pagamento de indenização por danos morais. Nesse sentido, a Súmula n.º 35 deste Egrégio Tribunal de Justiça:

 

SÚMULA 35 – É vedada à instituição financeira a cobrança de tarifas de manutenção de conta e de serviços sem a prévia contratação e/ou autorização pelo consumidor, nos termos do art. 54, parágrafo 4º, do CDC. A reiteração de descontos de valores a título de tarifas bancárias não configura engano justificável. Presentes tais requisitos (má-fé e inexistência de engano justificável), a indenização por danos materiais deve ocorrer na forma do art. 42 (devolução em dobro), parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, ao passo que o valor dos danos morais será arbitrado a depender da magnitude do dano aferida pelo órgão julgador, nos termos do art. 54-D, parágrafo único, do CDC (aprovado na 141ª Sessão Ordinária Administrativa em 16 de julho de 2024).

 

Não restam dúvidas, portanto, da obrigação da instituição financeira em indenizar a parte apelante pelos abalos sofridos em decorrência dos descontos indevidos em benefício previdenciário.

Na fixação da indenização por danos morais, o magistrado deve agir com equidade, analisando a extensão do dano, as condições socioeconômicas e culturais dos envolvidos, as condições psicológicas das partes e o grau de culpa do agente, terceiro ou vítima. Tais critérios podem ser retirados dos artigos 944 e 945, ambos do Código Civil (CC), bem como do entendimento dominante do STJ.

Vale dizer, deve ser quantia que não seja insignificante, a ponto de não compor o sentimento negativo experimentado pela vítima, e que não seja tão elevada, a ponto de provocar o seu enriquecimento sem causa.

Nestas condições, apreciadas todas as questões postas, entendo que deveria ser arbitrada, a título de indenização do dano moral, a quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais), valor que atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em consideração a realidade das partes, a situação econômica e as particularidades do caso, considerando que limitaram ao desconto de tarifas bancárias com valor inferior a R$ 50,00 (cinquenta reais).

Quanto a repetição do indébito, com efeito, não há falar, in casu, em necessária prova da má-fé, vez que o instituto da repetição de indébito é aplicável tanto no caso de má-fé (dolo) como no caso de culpa, sendo suficiente a demonstração de a negligência da instituição financeira bancária na efetuação dos descontos indevidos. Nesse sentido:

 

EMENTA APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. INEXISTÊNCIA DA CONTRATAÇÃO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE. 1 – Apesar de apresentado o contrato entabulado entre as partes, a instituição financeira não se desincumbiu do ônus de comprovar que a suposta quantia tomada de empréstimo fora depositada em favor do consumidor, o que afasta a perfectibilidade da relação contratual, ensejando a declaração de sua inexistência. 2 – Assim, impõe-se a condenação do banco fornecedor do serviço ao pagamento de indenização por danos morais, que se constituem in re ipsa, e a devolução em dobro da quantia que fora indevidamente descontada (repetição do indébito – art. 42, parágrafo único, do CDC). 3 – No que se refere ao quatum indenizatório relativo aos danos morais, entendo que o valor arbitrado na origem, a saber, R$ 5.000,00 (cinco mil reais), é desproporcional, e deve ser reduzido para R$ 3.000,00 (três mil reais), quantum esse compatível com o caso em exame e que vem sendo adotado pelos integrantes desta 4ª Câmara Especializada Cível em casos semelhantes 4 – Recurso conhecido e provido parcialmente.

(TJPI | Apelação Cível Nº 0800655-33.2018.8.18.0065 | Relator: Oton Mário José Lustosa Torres | 4ª CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL | Data de Julgamento: 28/05/2021)

 

Considerando a nulidade do contrato, evidencia-se a negligência, motivo pelo qual deve ser concedida a repetição em dobro. 

Quanto a prescrição, prevê o art. 27 do CDC, que prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.

Com efeito, versando a matéria acerca de relação de trato sucessivo, a contagem referente à prescrição deve ser realizada a partir do último desconto efetuado e não do primeiro. Nesse sentido, eis os julgados a seguir:

 

EMENTA: CÍVEL. CONSUMIDOR. PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. APLICAÇÃO DO CDC. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. APLICAÇÃO DO ART. 27 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. NULIDADE DO CONTRATO. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. DANO MORAL CONFIGURADO. DEVER DE INDENIZAR. SENTENÇA REFORMADA. 1. Nas demandas envolvendo contratos bancários de empréstimo consignado, aplica-se o prazo prescricional de 5 (cinco) anos à pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos por ausência de contratação com a instituição financeira, na forma do Art. 27 do Código de Defesa do Consumidor. Levando em consideração que a pretensão de reparação pelo dano sofrido renova-se mês a mês, o termo inicial para a contagem do prazo prescricional deve ser tido como sendo a data do último desconto sofrido. [...]

(TJPI | Apelação Cível Nº 0801911-36.2022.8.18.0076 | Relator: José Ribamar Oliveira | 4ª C MARA ESPECIALIZADA CÍVEL | Data de Julgamento: 17/05/2024)

         

Compulsando os autos, constata-se que os descontos de tarifas se dão de forma contínua. Assim, a ação foi ingressada dentro do lapso de 05 anos, verificando-se a inocorrência da prescrição do fundo de direito.

 

DISPOSITIVO

 

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso, para reformar a sentença e julgar procedente a ação proposta, para:

a) DETERMINAR o cancelamento da cobrança de tarifas bancárias, não devidamente demonstrada sua contratação, objeto desta ação, tendo em vista sua nulidade;

b) CONDENAR a empresa ré a restituir em dobro os valores descontados, a ser apurado por simples cálculo aritmético, com correção monetária nos termos da Tabela de Correção adotada na Justiça Federal (Provimento Conjunto n° 06/2009 do Egrégio TJPI), acrescentado o percentual de juros de mora de 1% ao mês, atendendo ao disposto no art. 398, do Código Civil vigente, ambos os termos a serem contados da data de cada desconto indevido (súmulas 43 e 54 do STJ).

c) CONDENAR a parte ré a pagar o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), com os devidos acréscimos legais, a título de indenização por danos morais. Sobre o valor deve-se aplicar a correção monetária nos termos da Tabela de Correção adotada na Justiça Federal (Provimento Conjunto nº 06/2009 do Egrégio TJPI), a contar da data de publicação deste decisum (Súmula 362, STJ), e acrescentado o percentual de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a contar do evento danoso, qual seja, a data da contratação fraudulenta, atendendo ao disposto no art. 398, do Código Civil vigente, e ao entendimento da Súmula 54, STJ

Invertidos os ônus sucumbenciais, condeno o banco requerido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.

 

Preclusas as vias impugnativas, dê-se baixa na distribuição, com a consequente remessa dos autos ao juízo de origem.


Teresina, 8 de janeiro de 2025


Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO 

Relatora

(TJPI - AGRAVO INTERNO CÍVEL 0800500-49.2022.8.18.0078 - Relator: LUCICLEIDE PEREIRA BELO - 3ª Câmara Especializada Cível - Data 09/01/2025 )

Detalhes

Processo

0800500-49.2022.8.18.0078

Órgão Julgador

Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO

Órgão Julgador Colegiado

3ª Câmara Especializada Cível

Relator(a)

LUCICLEIDE PEREIRA BELO

Classe Judicial

AGRAVO INTERNO CÍVEL

Competência

Câmaras Cíveis

Assunto Principal

Dever de Informação

Autor

BANCO BRADESCO S.A.

Réu

MARIA BARBOSA DA SILVA

Publicação

09/01/2025