Decisão Terminativa de 2º Grau

Empréstimo consignado 0800651-14.2024.8.18.0088


Decisão Terminativa

 

PODER JUDICIÁRIO 
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ
GABINETE Da DESEMBARGADORA LUCICLEIDE PEREIRA BELO

ORGÃO JULGADOR : 3ª Câmara Especializada Cível

 APELAÇÃO CÍVEL (198) No 0800651-14.2024.8.18.0088

APELANTE: BANCO BMG SA

APELADO: MARIA JOSE ROCHA

RELATOR(A): Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO



APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CONTRATO C/C DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. AVERBAÇÃO DE RESERVA DE MARGEM PARA CARTÃO. EXCLUÍDA. AUSÊNCIA DE DESCONTOS. SÚMULA 26 DO TJPI. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 


DECISÃO MONOCRÁTICA 


RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por BANCO BMG SA contra sentença nos autos da AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO GERADO POR CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL ajuizada por MARIA JOSE ROCHA, em face do banco ora apelado. 

Na sentença (id. 18733616), o d. juízo a quo julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, nos seguintes termos: 


ANTE O EXPOSTO, respaldado na fundamentação já explicitada, JULGO PROCEDENTE o pedido, nos seguintes termos: 1 – DECLARAR A NULIDADE do contrato de crédito rotativo discutido nos autos. 2 - CONDENAR a parte o réu à devolução dos valores descontados do benefício previdenciário da parte autora, de forma dobrada, nos termos do Art. 42, do CDC, com incidência de juros de mora de 1% a.m contados da citação e correção monetária nos termos da Tabela de Correção adotada na Justiça Federal (Provimento Conjunto nº 06/2009 do Egrégio TJPI), com incidência da data de cada desconto, observado que, ultrapassado o lapso prescricional de 05 anos, contados do efetivo pagamento à data da propositura da ação, a repetição do valor estará prescrita. Os valores deverão ser especificados em sede de liquidação de sentença. 3 – CONDENAR a parte ré à exclusão do contrato e descontos do benefício previdenciário da parte autora. 4 – CONDENAR a parte ré a pagar, a título de compensação pelos danos morais causados, o valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), com correção monetária nos termos da Tabela de Correção adotada na Justiça Federal (Provimento Conjunto nº 06/2009 do Egrégio TJPI) desde a data do arbitramento, e juros de mora de 1% ao mês a incidir desde a data da citação. Condeno a parte ré nas custas processuais e honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação.

Em suas razões (id. 18733618), o banco apelante alega, preliminarmente, a impossibilidade de concessão da justiça gratuita e a prescrição da pretensão. No mérito, sustenta a regularidade da contratação do cartão de crédito consignado. Aduz que a parte autora é pessoal alfabetizada, não havendo que se falar em falha no dever de informação e que a não utilização do cartão não induz à presunção de erro na contratação. Afirma a inexistência de requisitos ensejadores da condenação em danos materiais e morais. Requer o provimento do recurso e reforma da sentença. 

Em contrarrazões (id. 18733625), a apelada, preliminarmente, alega que não há que se falar em prescrição ou decadência. No mérito, requer o improvimento do apelo e manutenção da sentença. 

Desnecessária a remessa dos autos ao Ministério Público Superior, por não existir razão de fato e/ou de direito que justifique sua intervenção.

FUNDAMENTAÇÃO

Recurso tempestivo e formalmente regular. Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, CONHEÇO do apelo.

I. Preliminares

Da Justiça Gratuita: 

Primeiramente, destaca-se que em favor da pessoa natural milita a presunção - ainda que relativa - de veracidade das informações acerca de sua hipossuficiência financeira e impossibilidade de arcar com as despesas processuais (art. 99, §3º, do NCPC). 

Em análise dos autos, constato ter fundamento a concessão da justiça gratuita em favor do apelante, uma vez que é aposentada por idade e recebe contribuição de apenas R$ 1.412,00 (um mil quatrocentos e doze reais), conforme extrato do INSS (id.18733342).

Assim, rejeito a preliminar de impugnação à concessão da justiça gratuita. 

Da prescrição: 

Com efeito, versando a matéria acerca de relação de trato sucessivo, a contagem referente à prescrição deve ser realizada a partir do último desconto efetuado e não do primeiro. Nesse sentido, eis os julgados a seguir:


EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO NÃO VERIFICADA. RELAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO. TERMO INICIAL. VENCIMENTO DA ÚLTIMA PARCELA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1 - Tratando-se de obrigação de trato sucessivo (contrato de empréstimo consignado), onde a violação do direito ocorre de forma contínua, mês a mês, o termo inicial da prescrição é a data correspondente ao vencimento da última parcela e não ao da primeira. Precedentes. 2 – […]

(TJPI | Apelação Cível Nº 0800385-91.2017.8.18.0049 | Relator: Oton Mário José Lustosa Torres | 4ª CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL | Data de Julgamento: 04/06/2021)

Compulsando os autos, constato que a Reserva de Margem foi inserida em 01/06/2018 e somente foi excluída em 02/02/2022 (id. 18733342- pág. 06). 

Desta forma, tendo a ação sido ajuizada em 05/03/2024, dentro do lapso de 05 anos a contar do ultimo desconto, verifico que não houve prescrição do fundo de direito


II. Mérito

O presente caso deve ser apreciado à luz do Código de Defesa do Consumidor (CDC), sendo imprescindível o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, que, inclusive, é pessoa analfabeta.

Nesse sentido, a Súmula nº 297 do Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ) prevê que “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.

Contudo, a aplicação da CDC não pode promover um favorecimento desmedido de um sujeito em detrimento de outro, pois o objetivo da norma é justamente o alcance da paridade processual.

A interpretação teleológica é consagrada no ordenamento jurídico brasileiro, porquanto o artigo 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) impõe que, “Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”.

Nessa direção, ademais, este Egrégio Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 26, nestes termos:

Súmula 26 do TJPI: Nas causas que envolvem contratos bancários, aplica-se a inversão do ônus da prova em favor do consumidor (CDC, art. 6º, VIII) desde que comprovada sua hipossuficiência em relação à instituição financeira, entretanto, não se dispensa que o consumidor prove a existência de indícios mínimos do fato constitutivo do seu direito, de forma voluntária ou por determinação em juízo. (grifou-se)

Pois bem.

Não há nos autos prova de qualquer desconto decorrente do Contrato nº 6637604

Pelo contrário, o extrato obtido junto ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e juntado aos autos pela própria parte autora/apelante faz prova de que a RESERVA DE MARGEM PARA CARTÃO foi incluída em 01/06/18 e excluída em 02/02/22, sem que tenha sido efetuado nenhum desconto (Id. 18733342 - pág. 06). 

 Nesse contexto, impõe-se a conclusão pela ausência de ato ilícito praticado pela instituição financeira, e, consequentemente, a reforma da sentença vergastada, que julgou procedentes os pedidos autorais.

III. DISPOSITIVO 

Com estes fundamentos, DOU PROVIMENTO ao recurso para reformar a sentença e julgar improcedentes os pedidos autorais. 

Invertidos os ônus sucumbenciais, condeno a autora/requerente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação (art. 85, §§1º e 2º, do CPC), sob a condição suspensiva do art. 98, §3º do CPC. 

Preclusas as vias impugnativas, dê-se baixa na distribuição, com a consequente remessa dos autos ao juízo de origem.

Publique-se. Intime-se. Cumpra-se.

Preclusas as vias impugnatórias, arquive-se, dando-se baixa na Distribuição de 2º grau.


Teresina, 23 de setembro de 2024


Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO 

 Relatora

(TJPI - APELAÇÃO CÍVEL 0800651-14.2024.8.18.0088 - Relator: LUCICLEIDE PEREIRA BELO - 3ª Câmara Especializada Cível - Data 30/09/2024 )

Detalhes

Processo

0800651-14.2024.8.18.0088

Órgão Julgador

Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO

Órgão Julgador Colegiado

3ª Câmara Especializada Cível

Relator(a)

LUCICLEIDE PEREIRA BELO

Classe Judicial

APELAÇÃO CÍVEL

Competência

Câmaras Cíveis

Assunto Principal

Empréstimo consignado

Autor

BANCO BMG SA

Réu

MARIA JOSE ROCHA

Publicação

30/09/2024